O reforço de infraestruturas e de recursos humanos, a criação de um modelo centralizado de financiamento e de uma rede nacional de referenciação, bem como o investimento na geração de evidência e o incremento de apoios a pacientes e cuidadores são as prioridades identificadas pelos peritos envolvidos na iniciativa SHARP. Promovida pelo NOVA Center for Global Health (NCGH), da NOVA Information Management School (NOVA IMS), com o apoio da Kite, uma empresa Gilead Sciences, esta iniciativa pretende traçar uma agenda estratégica que garanta o acesso equitativo às terapias celulares, com particular foco na terapia com células CAR-T.

O relatório estratégico que é apresentado hoje sobre o futuro da terapia com células CAR-T em Portugal, delineia um caminho para a expansão e sustentabilidade da adoção desta terapia. A terapia celular CAR-T é uma das mais inovadoras abordagens no tratamento do cancro, oferecendo uma alternativa promissora para pacientes com cancros hematológicos que não respondem aos tratamentos convencionais.

Este trabalho reuniu os principais stakeholders do ecossistema da saúde, incluindo profissionais de saúde, investigadores, decisores políticos e executivos, bem como pacientes, associações de pacientes e cuidadores, com o objetivo de definir uma estratégia coordenada e sustentável para garantir um acesso equitativo e atempado a este tratamento inovador.

Segundo Henrique Lopes, diretor do NCGH, “o que este relatório propõe é uma ponte entre a inovação científica e a decisão política – um contributo para que os atores políticos e institucionais disponham das bases necessárias para tomar decisões informadas para garantir a adoção sustentável e equitativa destas terapias em Portugal”. Acrescenta ainda que “o desafio é coletivo: transformar as recomendações em decisões que façam a diferença na vida dos doentes e na capacidade de resposta do sistema de saúde”.

Um marco na luta contra o cancro, mas ainda com desafios na sua adoção em Portugal

A terapia com células CAR-T (Chimeric Antigen Receptor T-cell therapy) consiste numa imunoterapia personalizada, onde os linfócitos T do próprio paciente são geneticamente modificados para reconhecer e eliminar células cancerígenas. Apesar da sua eficácia clínica comprovada, o acesso a este tratamento em Portugal ainda enfrenta desafios significativos, nomeadamente:

  • Heterogeneidade de critérios de referenciação e elegibilidade para tratamento, potencialmente contribuindo para um acesso não equitativo à terapia;
  • Limitada evidência de utilização das terapias celulares e de divulgação de dados epidemiológicos atempadamente, o que dificulta a tomada de decisão a todos os níveis;
  • Modelo de financiamento inadequado e custo elevado da terapia, dificultando a sustentabilidade e a expansão da sua utilização.
  • Insuficiência de infraestruturas, recursos materiais e recursos humanos especializados, restringindo a disponibilidade para expansão da utilização da terapia;
  • Escassez de apoios dedicados aos pacientes, cuidadores e suas famílias, limitando a acessibilidade à terapia e a facilidade de completar todo o processo de tratamento.

O relatório final da Iniciativa SHARP, elaborado pelo NCGH em colaboração com o Steering Committee (SC) da Iniciativa, composto por peritos de referência, propõe um conjunto de medidas estratégicas para responder a estes desafios e permitir a expansão da utilização da terapia CAR-T em Portugal.

“Só um número limitado dos doentes com indicação potencial para terapia com células CAR T tem acesso a ela, em Portugal como noutros países”, alerta Maria Gomes da Silva, médica hematologista do IPO de Lisboa e membro do SC da iniciativa SHARP. A especialista considera fundamental “tornar mais claros, homogéneos e eficazes os percursos dos doentes candidatos, de forma a otimizar e reforçar os recursos existentes e alargar o acesso a todos os que possam beneficiar deste tratamento”.

A estes fatores impõe-se, segundo Fernando Leal da Costa, médico hematologista do IPO de Lisboa e membro do SC, a necessidade de “definição da distribuição territorial dos centros de referência para tratamentos com células CAR e a organização dos fluxos de doentes.”

Importa ainda referir a indispensabilidade de um cuidador que acompanhe o doente, garantindo que nos primeiros trinta dias após o tratamento o mesmo está permanentemente acompanhado, o que, segundo Manuel Abecasis, Presidente da Associação Portuguesa Contra a Leucemia e membro do SC, implica “rever o estatuto do cuidador para estes doentes, de modo a garantir que o cuidador não é prejudicado materialmente pelo desempenho destas funções”.

 

Cinco eixos de atuação prioritários para o futuro da terapia CAR-T em Portugal

Através de um Think Tank estruturado em três sessões, a iniciativa SHARP identificou cinco eixos de atuação prioritários para garantir o acesso equitativo e atempado a esta terapia no Serviço Nacional de Saúde:

  1. Investir na capacitação dos profissionais e dos serviços de saúde, garantindo a alocação dos recursos necessários
  • Criar equipas dedicadas às terapias celulares.
  • Agilizar o acesso a meios complementares de diagnóstico e terapêutica.
  1. Criar um programa vertical de financiamento centralizado
  • Garantir financiamento uniforme e sustentável para os centros de tratamento.
  • Negociar o preço da terapia, tornando-a mais acessível e equitativa.
  1. Desenvolver uma rede nacional de referenciação para terapias celulares e uniformizar os critérios de elegibilidade para tratamento
  • Harmonizar os critérios e o processo de referenciação e tratamento.
  • Criar uma rede integrada de centros de tratamento.
  1. Assegurar o suporte socioeconómico, logístico e formativo necessário ao paciente, seu cuidador e família
  • Estabelecer redes de apoio comunitário ao longo da jornada de tratamento.
  • Criar uma resposta social formal perante a inexistência ou incapacidade do cuidador.
  1. Robustecer a capacidade de gerar e divulgar evidência de mundo real na área das terapias celulares
  • Criar um Registo Nacional de Terapias Celulares.
  • Desenvolver estudos com evidência do mundo real.

 

Um apelo à ação: implementar uma estratégia nacional coordenada para melhorar a adoção das terapias celulares em Portugal

A Iniciativa SHARP destaca a necessidade premente de uma estratégia nacional coordenada para ampliar o acesso à terapia CAR-T em Portugal. As conclusões deste relatório oferecem um quadro orientador para decisores políticos e executivos, profissionais de saúde e indústria, permitindo a implementação de medidas concretas que maximizem o benefício para os pacientes e reforcem a posição de Portugal na utilização de inovação terapêutica.

Esta iniciativa reafirma o compromisso do NCGH em contribuir para a geração de conhecimento para a tomada de decisões informadas em saúde, tendo em vista a modernização do sistema de saúde em Portugal, promovendo soluções que melhorem a equidade de acesso e eficiência dos cuidados de saúde para toda a população.

Sobre a Iniciativa SHARP

Coordenada pelo NOVA Center for Global Health (NCGH), unidade de investigação da NOVA Information Management School (NOVAIMS), com o apoio da Kite, uma empresa da Gilead Sciences, a Iniciativa SHARP reuniu profissionais de saúde, pacientes, associações de pacientes, cuidadores, investigadores, decisores políticos e executivos, para discutir a gestão e expansão do acesso à terapia com células CAR-T em Portugal, uma das tecnologias mais promissoras e inovadoras na luta contra alguns cancros do sangue.

COMUNICADO/SO

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