É com lamentos, mas também com elogios e em festa que Eduardo Vítor Rodrigues se despede da Câmara Municipal de Gaia. O autarca, que perdeu o mandato por ter ido à padaria com o carro de serviço, só deixa o lugar no dia 30, mas esta segunda-feira foi dia de despedidas: teve a última sessão de câmara, divulgou um vídeo de despedida e vai passar a noite a celebrar o S. João com o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, e com o primeiro-ministro, Luís Montenegro.

Tanto Rui Moreira, como Eduardo Vítor Rodrigues são autarcas em fim de mandato, por completarem 12 anos à frente das respetivas câmaras, mas o presidente de Gaia acaba por sair uns meses antes devido à decisão do Tribunal Constitucional que confirmou a decisão do Tribunal de Gaia de condenação pelo crime de peculato, com consequente perda de mandato. Esta segunda-feira os autarcas dos dois lados do Douro encontraram-se no tabuleiro de uma das pontes que une as cidades, a ponte Luiz I, vão jantar juntos e com Luís Montenegro e depois assistem ao espetáculo de fogo-de-artifício que, pela primeira vez, estende-se da Ponte Luiz I até à Ponte da Arrábida, durante 16 minutos.

De manhã, Eduardo Vítor Rodrigues afirmou que, apesar das circunstâncias, sai com “grande tranquilidade”, com “muito orgulho” e “sem nenhum peso na consciência”. “Nós encontrámos a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia com 300 milhões de euros de dívidas, hoje temos as contas no verde, não devemos nada a ninguém e temos as empresas municipais com lucro, ou seja, com contas positivas”, destacou em declarações aos jornalistas, no fim da reunião extraordinária do executivo municipal, a última por si presidida. Um balanço que também quis deixar um vídeo de 15 minutos que divulgou nas redes sociais.

A liderança da autarquia passa para a atual vice-presidente, Marina Mendes. O candidato do PS às próximas eleições autárquicas, que ainda não estão marcadas, mas vão realizar-se em setembro ou outubro é o ex-deputado João Paulo Correia, que já foi presidente da Junta de Freguesia de Mafamude, a maior do concelho e uma das maiores do país. Já o PSD ainda não divulgou quem será o candidato, mas continua a falar-se no nome de Luís Filipe Menezes, que presidiu à autarquia por 12 anos, sendo sucedido por Eduardo Vítor Rodrigues.


A "mancha" da Operação Babel

Na despedida, Eduardo Vítor Rodrigues assumiu que o processo Babel, que levou à detenção do ex-vice-presidente Patrocínio Azevedo, manchou o projeto autárquico, mas manchou, sobretudo, a justiça. “O assunto [processo Babel] manchou a câmara, manchou o projeto autárquico, manchou o presidente, manchou os vereadores, destruiu-o a ele [Patrocínio Azevedo], mas manchou, sobretudo, a justiça”, afirmou no final da reunião extraordinária do executivo municipal que aprovou, com dois votos contra do PSD, o relatório de gestão e demonstrações financeiras consolidadas de 2024.

A Operação Babel, relacionada com a alegada viciação e violação de normas e instrução de processos de licenciamento urbanísticos em Gaia, tem 16 arguidos, incluindo Patrocínio Azevedo que, à data do processo, era vice-presidente de Câmara de Vila Nova de Gaia e que, nesta sequência, renunciou ao mandato. Patrocínio Azevedo, que esteve cerca de 23 meses em prisão preventiva, foi libertado em abril, ficando sujeito a apresentações periódicas às autoridades três vezes por semana e proibido de contactar com os restantes arguidos.

Eduardo Vítor Rodrigues referiu que este processo manchou a justiça porque o ex-vice-presidente da câmara esteve 23 meses preso por, alegadamente, ter recebido uma mochila com 100 mil euros que, a meio do julgamento, se percebeu que não recebeu nada. “Depois é mandado para casa e não se passa nada, por isso, é uma mancha no trajeto deste processo e acho que temos todos que sentir uma pequenina mancha na nossa estrutura institucional e no nosso sistema de poder”, atirou, acrescentando que atualmente o país trata por igual quem rouba 10 ou 20 milhões de euros e quem vai à padaria com o carro da câmara.

“Eu tenho a sensação de que a minha saída serve, em primeiro lugar, para dizer à Associação Nacional de Municípios Portugueses e para dizer ao Governo que importa legislar porque um país em que a justiça se deixa manipular por denúncias anónimas e por jogadas de bastidores não é um presidente de câmara que está em jogo, é uma democracia toda”, sublinhou. Em sua opinião, é preciso refletir sobre isto porque um dia estará à frente destas instituições quem não se importe que lhe chame ladrão porque, se calhar, até o é e, portanto, não tem vergonha nenhuma.

Os vereadores da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia eleitos pelo PS consideraram que a saída do presidente da câmara se deve “única e exclusivamente a comportamentos sujos e escondidos na neblina de perseguição política”.

“Num contexto em que a saída de Eduardo Vítor Rodrigues [presidente de câmara] se deve única e exclusivamente a comportamentos sujos e escondidos na neblina de perseguição política reiteramos o nosso compromisso: a nossa voz continuará firme e segura”, afirmou o vereador da Juventude e Voluntariado Jovem, Elísio Ferreira Pinto, em nome dos restantes vereadores eleitos pelo PS.

Manifestando orgulho pelo desempenho de Eduardo Vítor Rodrigues, que deixa a liderança da Câmara de Vila Nova de Gaia a 30 junho, os vereadores socialistas garantem que nunca conseguirão “sujar, nem manchar minimamente” o seu legado. “Juntamente com a maioria que o elegeu, manifestamos o orgulho pelo melhor presidente da câmara que este concelho alguma vez teve”, referiu Elísio Ferreira Pinto.