
Uma equipa de investigadores da Universidade de Harvard descobriu que a deficiência de lítio está relacionada com o início e com a progressão da doença de Alzheimer. Numa pesquisa publicada esta semana na prestigiada revista científica Nature, os cientistas revelam que a reposição deste metal no organismo através da administração de um sal pode prevenir perdas de memória e outras alterações provocadas pela demência.
Ao analisarem amostras humanas recolhidas post-mortem e conservadas num banco de cérebros para estudar o papel potencialmente desempenhado por cerca de 30 elementos químicos metálicos como o zinco e o cobre no aparecimento da doença, os investigadores detetaram uma deficiência significativa de lítio no córtex pré-frontal de pessoas com défice cognitivo ligeiro e Alzheimer.
De acordo com a investigação, entre todos os elementos químicos analisados, apenas os níveis de lítio sofrem uma redução drástica à medida que a doença progride.
Segundo a equipa, as placas de proteína beta amiloide que se sabe acumularem-se no cérebro de pessoas que sofrem da doença ‘aprisionam’ o lítio, impedindo-o de exercer a sua função e provocando uma redução acentuada, que afeta todas as células cerebrais. “A deficiência de lítio é um possível mecanismo comum para a degeneração multissistémica do cérebro que dá origem à demência”, afirma Bruce Yankner, coordenador da pesquisa, citado pelo diário espanhol El Pais.
O papel do lítio como estabilizador de humor é conhecido há décadas, sendo utilizado em doses terapêuticas no tratamento da doença bipolar e de outras perturbações psiquiátricas, mas “a ideia de que a deficiência de lítio pode ser uma causa do Alzheimer é nova”, salienta o cientista.
Mais de um século depois da descoberta do Alzheimer, os mecanismos que levam ao seu aparecimento ainda não são claros, em particular no que diz respeito aos fatores que contribuem para precipitar o início da doença, pelo que a descoberta é destacada pela Universidade de Harvard como tendo “grande relevância científica”.
Novas perspetivas para o tratamento
Para explorar o impacto dos níveis de lítio no cérebro, os cientistas usaram modelos de ratinhos, tendo removido este elemento químico da sua dieta. Em consequência, observaram um aumento acentuado dos depósitos de beta-amiloide e outras alterações fisiológicas que levaram à perda de sinapses e aceleraram o declínio cognitivo.
Os cientistas constataram ainda que a reposição dos níveis com orotato de lítio, um composto que não fica retido nos depósitos de beta amiloide, permitiu prevenir alterações cognitivas patológicas e perda de memória, tanto nos ratinhos com doença de Alzheimer como em ratinhos em processo de envelhecimento normal.
Por isso, a Universidade de Harvard sublinha que a investigação “sugere uma abordagem terapêutica diferente”, abrindo perspetivas promissoras a nível do tratamento da doença.
Assim, os autores da pesquisa apelam ao início de ensaios clínicos para aprofundar o estudo do orotato de lítio em seres humanos, mas alertam os cidadãos para que não tomem suplementos dietéticos por iniciativa própria, uma vez que o lítio pode ser tóxico e obriga a um controlo rigoroso da dose.