A comediante basca Ane Lindane está no centro de uma nova controvérsia sobre limites da liberdade de expressão, depois de, este domingo, ter encenado um ato sexual numa igreja, durante o festival Euskal Herria Zuzenean (EHZ), realizado na pequena localidade de Arberatze-Zilhekoa, no País Basco francês. Lindane subiu para o altar e simulou um ato de masturbação com um crucifixo, enquanto gritava “Hil da Jainkoa!”, expressão em basco que significa “Deus está morto!”, segundo o “El País”.

A atuação foi acompanhada por cerca de 200 pessoas, mas o assunto só ganhou dimensão em Espanha depois de a comediante ter partilhado um vídeo do momento na rede social X, acompanhado de um texto: “Abalamos as bases do catolicismo com gargalhadas. Profanamos, amaldiçoamos e denunciamos os abusos sexuais da Igreja.”

A Fundação Espanhola de Advogados Cristãos, que junta advogados, procuradores, juristas, professores e estudantes de Direito em defesa da “liberdade religiosa, da vida e da família”, anunciou a apresentação de uma queixa contra Lindane, por possível violação do artigo 525 do Código Penal espanhol, que pune com pena de multa de oito a 12 meses as ofensas aos sentimentos de pessoas de uma confissão religiosa,por se fazer escárnio dos seus “dogmas, crenças, ritos ou cerimónias”. Trata-se de um artigo que já foi alvo de críticas da Amnistia Internacional em Espanha, por impor limites muito abrangentes à liberdade de expressão.

A presidente da Advogados Cristão, Polonia Castellanos, considerou que “a atriz foi a França para cometer o crime, pois é um dos poucos países europeus onde esse tipo de ação não está prevista no Código Penal”, menciona o diário espanhol Para Castellanos, é um alerta para o que poderá suceder em Espanha, caso se avance com a descriminalização dos crimes contra os sentimentos religiosos.

Ainda ao “El País”, Lindane disse não ter planeado o local da atuação – “Eu não sabia que iria apresentar-me numa igreja” – e garante ter improvisado com os objetos que encontrou no espaço. “Comecei com a cruz, fiz aquele gesto e, depois, entrei no meu monólogo habitual, onde há sempre muitas chapadas sobre a Igreja Católica”, justificou.

A comediante afirma que o vídeo gerou mais polémica do que alguma vez imaginou. “Recebi ameaças de violação e morte de grupos extremistas”, contou. Porém, mantém a sua posição: “Uma das obrigações dos palhaços é precisamente isto: apontar estas realidades, ridicularizá-las, humilhá-las e urinar sobre elas. Essa é a minha missão como comediante”.

Além da sua carreira em palco, Lindane tem colaborado com programas de rádio e televisão e escreve regularmente para publicações feministas.

Texto de Nadja Pereira, editado por João Pedro Barros