
Qual a importância de se assinalar o Dia Mundial da Asma?
O Dia Mundial da Asma é um evento organizado pela GINA (Global Initiative for Asthma) da Organização Mundial da Saúde (OMS) e celebra-se anualmente, desde 1998, em mais de 35 países. Com este dia pretende-se chamar a atenção para a importância da asma e do seu tratamento no controlo desta doença crónica.
Este ano, o Dia Mundial da Asma celebra-se a 6 de maio e tem como tema “Tornar os tratamentos inalatórios acessíveis para todos!”, enfatizando a necessidade de garantir que as pessoas com asma tenham acesso aos medicamentos inalados essenciais para o controlo da doença e tratamento das crises.
A asma continua a ser subdiagnosticada em Portugal? Quais os maiores desafios na identificação precoce?
De acordo com dados recentes do estudo Epi-Asthma, um em cada três doentes asmáticos não tem o diagnóstico registado no processo clínico e 70% destes doentes não teve tratamento nos últimos 12 meses, o que mostra a necessidade de medidas para melhorar o acesso ao diagnóstico e acompanhamento da doença. Um dos maiores obstáculos para se chegar ao diagnóstico é o facto de os doentes com asma acharem que só precisam de tratamento quando têm sintomas e não procurarem ajuda médica. Já em relação aos serviços de saúde, o mesmo estudo conclui que “falha o acompanhamento em termos de frequência e periodicidade das consultas e uma menor atenção dos profissionais em relação aos programas de seguimento das doenças respiratórias, sobretudo devido à sobrecarga de trabalho e à multiplicidade de tarefas”. Falha também a realização de mais estudos funcionais respiratórios, nomeadamente a espirometria, que permite confirmar o diagnóstico e avaliar a gravidade da obstrução das vias aéreas. Este estudo conclui que “é essencial continuar a investir e melhorar os programas de vigilância e controlo para as doenças respiratórias, bem como promover a literacia em saúde respiratória”.
Qual a prevalência da asma e o seu impacto na população portuguesa?
Em Portugal, a prevalência da asma é de aproximadamente 7%, afetando cerca de 700 mil portugueses, sendo a maioria em idade escolar ou laboral. Entre os doentes com asma, 68% não têm a doença controlada, o que pode ser devido a vários fatores, nomeadamente, falta de literacia em saúde respiratória, insuficiente adesão ao tratamento, falhas na medicação, erros na técnica de utilização dos inaladores e os custos associados à medicação.
Cerca de 5% destes doentes têm asma grave, responsável por mais de 50% da utilização dos recursos de saúde destinados aos doentes asmáticos, além do impacto socioeconómico significativo, resultante da ausência da atividade laboral e escolar, frequentemente associada às agudizações da doença.
O estudo Epi-Asthma Portugal revelou que, entre os fatores de risco que podem justificar esta prevalência, a má qualidade do ar interior (humidade, bolores ou exposição a fumo de tabaco) e exterior (poluição atmosférica) constitui um risco aumentado de asma.
Qual a importância de se manter o doente controlado?
A asma é uma doença inflamatória crónica das vias aéreas que provoca sintomas respiratórios, tais como dispneia, pieira, tosse e opressão torácica, que se associa a hiperatividade brônquica e alterações estruturais das vias aéreas.
A asma não tem cura, mas pode ser controlada. A asma não controlada associa-se a pior qualidade de vida, ausência escolar e laboral, mais consultas médicas, mais idas aos serviços de urgência, maior número de internamentos hospitalares e maior mortalidade por asma.
A asma está controlada quando não há sintomas diurnos (ou sintomas mínimos), ausência de sintomas noturnos, sem limitação da atividade, sem necessidade de medicação de alívio, sem crises ou agudizações (ou raramente) e uma função pulmonar normal (ou próxima do normal).
O doente controlado tem uma qualidade de vida igual à do não asmático, menor risco futuro de crises com necessidade de medicação de urgência, e redução da morbilidade e mortalidade por asma.
Que desafios ainda existem na adesão à terapêutica, sobretudo à inalada?
A educação do doente asmático em relação à sua doença, fatores de risco e a elaboração de um plano de tratamento individualizado são fundamentais para melhorar a adesão ao tratamento.
Existe ainda alguma fobia na adesão às terapêuticas inalatórias, sobretudo em relação aos corticosteroides inalados, e uma tendência para a sua interrupção uma vez resolvida a crise.
Cabe aos profissionais de saúde (médicos, enfermeiros e técnicos de saúde) desmistificar estes receios e esclarecer os doentes acerca da necessidade desta medicação diária para se atingir o controlo da asma.
A asma é uma doença inflamatória crónica das vias aéreas, como tal, os corticosteroides inalados, fármacos anti-inflamatórios, são os medicamentos de primeira linha (medicação de controlo) no tratamento da asma, segundo as recomendações da GINA (Global Initiative for Asthma), e devem ser tomados diariamente para prevenir o aparecimento dos sintomas, melhorar a função pulmonar e prevenir as crises. Podem ser tomados isoladamente ou em associação com os medicamentos broncodilatadores de longa duração.
A fraca adesão à terapêutica e a utilização incorreta dos dispositivos de inalação constituem algumas das principais barreiras à realização de um tratamento eficaz. O controlo da asma é maior quando a intervenção médica envolve uma componente educativa. A motivação da pessoa com asma, o incentivo sistemático sobre a necessidade de cumprimento da terapêutica, de acordo com um plano escrito, e o ensino continuado e regular sobre uma correta técnica de inalação são fundamentais para o sucesso da terapêutica.
A educação terapêutica está a ser bem implementada nas unidades de saúde? A referenciação para consulta de Imunoalergologia está a funcionar de forma adequada?
A Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica (SPAIC) tem desenvolvido um trabalho contínuo em colaboração com a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF), através do Grupo de Estudos de Doenças Respiratórias da APMGF (GRESP), na área da formação em asma e doenças alérgicas, o que tem permitido melhorar a qualidade da identificação das patologias imunoalérgicas, o seu tratamento e referenciação para a Imunoalergologia.
A nível do sistema de saúde, é necessário continuar a investir e melhorar os programas já existentes, melhorar o acesso a exames funcionais respiratórios (espirometrias), desenvolver sistemas de registo clínico para os profissionais de saúde e promover a literacia em saúde respiratória.
Que avanços científicos se esperam nos próximos anos no tratamento da asma?
Os avanços no tratamento da asma, nomeadamente da asma grave, são já uma realidade. Os medicamentos biológicos vieram “revolucionar” o tratamento destes doentes e modificar de modo significativo a sua qualidade de vida, melhorar a função pulmonar e reduzir o risco futuro da doença. Trata-se de anticorpos monoclonais que atuam sobre alvos específicos da doença e requerem um conhecimento da fisiopatologia da asma — os chamados fenótipos e endótipos. É uma medicina de precisão individualizada ao doente, que é administrada por via subcutânea e que, nalguns casos, pode ser autoadministrada no domicílio pelo próprio doente ou cuidador, mediante ensino prévio em hospital de dia de Imunoalergologia ou Pneumologia.
É uma mudança do paradigma no tratamento da asma, que introduz o conceito de remissão da doença, isto é, ausência de sintomas de asma, controlo da inflamação das vias aéreas, função pulmonar normal ou próxima do normal, e sem necessidade do uso de corticosteroides sistémicos.
No entanto, a asma continua a ser um desafio em termos de saúde pública, com disparidades no acesso aos cuidados de saúde e às terapêuticas inovadoras, e com encargos socioeconómicos muito elevados para os doentes e para os sistemas de saúde a nível global.
Sílvia Malheiro
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