Portugal recebe mais turistas do que nunca, mas será que está a receber os turistas certos? Segundo dados do INE, Portugal recebeu 29 milhões de turistas estrangeiros em 2024, representando um crescimento de 9,3% face ao ano anterior. A verdade é que, segundo a Associação de Hotelaria, Restauração e Similares (AHRESP), apesar do crescimento das receitas no turismo, as margens operacionais na hotelaria continuam muito reduzidas. Isto parece indicar um posicionamento em segmentos menos elevados do mercado turístico.
Embora este posicionamento do turismo em segmentos menos elevados tenha permitido a Portugal consolidar-se como destino turístico, cria pressões desproporcionais sobre infraestruturas face ao retorno económico. A proliferação de pensões, hostels (camaratas) e parques de campismo criou uma concorrência baseada no preço. Este tipo de oferta atrai visitantes com baixo poder de compra que, embora possam contribuir para a economia local, exercem pressão sobre as infraestruturas públicas devido ao seu maior número.
Um turista que paga 30€ por noite numa pensão não tem o mesmo impacto económico do que aquele que paga 300€ num hotel de qualidade. O primeiro consome recursos públicos – transportes, limpeza urbana, segurança – sem contribuição proporcional (que agora as autarquias tentam compensar através da taxa turística). O segundo dinamiza restauração, comércio tradicional, serviços culturais e cria emprego qualificado.
Além disso, uma economia de um país de média dimensão ao nível europeu não deve depender de um único setor. O peso excessivo do turismo na criação de riqueza compromete a diversificação económica, levando a uma situação semelhante ao que em economia se chama “Doença Holandesa”, em que a concentração excessiva da atividade económica num único setor provoca a estagnação dos restantes.
No entanto, Portugal pode – e deve – continuar a receber turistas, mas não qualquer turismo. O país deve posicionar-se como destino cultural, gastronómico e paisagístico de excelência, capaz de atrair visitantes exigentes, conscientes e que gastam mais. Esse é o turismo que vale a pena. O que fizemos no passado foi necessário porque éramos um país ainda sem reputação internacional para competir no segmento mais alto. Hoje já podemos aspirar a ser um fornecedor de serviços turísticos de elevado valor acrescentado.
Proponho uma moratória na abertura de novos estabelecimentos de alojamento turístico em centros urbanos e zonas residenciais (deixando em licenciamento livre as zonas rurais) que se destinem ao segmento médio e baixo do mercado, acompanhada de incentivos à requalificação da oferta existente. Esta proposta abrange pensões, hostels, parques de campismo e hotéis de uma estrela. A transição requer um cuidadoso planeamento municipal para minimizar impactos no emprego e garantir que os benefícios se estendem a toda a cadeia de valor do turismo.
Esta medida não é protecionismo – é planeamento estratégico. É uma forma de gerir recursos escassos com racionalidade económica e responsabilidade social. Amesterdão já adotou medidas para conter o chamado “turismo de festa”, limitando novos empreendimentos hoteleiros. Veneza restringe o número de navios de cruzeiro que podem visitar a cidade, algo que Barcelona também implementou. Deveríamos fazer o mesmo em Lisboa e no Porto.
Críticos poderão argumentar que esta proposta elitiza o turismo, mas a realidade é que o turismo de massas também exclui – expulsa residentes, inflaciona preços nos locais tradicionalmente mais acessíveis e degrada a experiência para todos. A restrição proposta forçará o setor a posicionar-se no segmento mais alto, atraindo turistas com maior poder de compra. Este reposicionamento beneficiará toda a cadeia de valor, permitindo a recuperação do comércio tradicional e empregos mais bem remunerados no setor.
Portugal não precisa de mais turistas – precisa de melhor turismo. Está na hora de privilegiar a qualidade, proteger os residentes e apostar num turismo que deixe valor duradouro no território.
Economista do Norte