
Num mundo marcado por conflitos, desigualdades e tensões, há quem escolha todos os dias ser construtor de paz. As fundações e a filantropia podem assumir um papel que vai muito além de doar dinheiro, através da promoção de redes de solidariedade, fortalecimento de comunidades e criação de espaços de diálogo para resolução de tensões e prevenção de conflitos antes que seja tarde demais.
Na Ucrânia, a National Network of Local Philanthropy Development (NNLPD), liderada por Daria Rybalchenko, tornou-se um ponto de encontro de solidariedade local e internacional. Mesmo com o financiamento local a diminuir drasticamente, acabaram por surgir soluções inovadoras, como o projeto da “Estufa Aquecida” da Fundação Comunitária de Voznesensk, que garante alimentos em tempos de escassez, ou plataformas como a “Ouvir a Comunidade”, que ajudam cidadãos a decidir em conjunto os caminhos das suas comunidades.
A tecnologia, muitas vezes vista como causa de polarização, pode também ser parte da solução. Daria Rybalchenko sublinha como as plataformas digitais foram fundamentais na mobilização de recursos na Ucrânia, unindo a diáspora, comunidades locais e parceiros internacionais. Quando usada com ética e foco no bem comum, a tecnologia pode amplificar vozes locais, mapear vulnerabilidades e construir pontes entre diferentes grupos, tornando-se uma ferramenta poderosa ao serviço da paz.
Nos Balcãs Ocidentais, Vesna Agic, uma das fundadoras do movimento Reimagining Peace, lembra-nos que a construção da paz não é um projeto de dois anos, mas um modo de vida. “Todos os dias, em todas as interações, podemos escolher ser construtores de paz”, defende Vesna. E isso faz-se através de pequenos gestos: criar espaços seguros para o diálogo, promover a empatia e combater a polarização que alimenta os conflitos. Para Vesna, a paz começa antes da guerra, começa quando se decide escutar o outro.
A despolarização é hoje um dos maiores desafios para a paz. Num tempo em que a desinformação e as redes sociais acentuam divisões, é decisivo promover espaços de escuta e compreensão mútua. Para Vesna Agic, combater a polarização passa por criar pontos de encontro seguros onde as pessoas possam dialogar, partilhar histórias de vida e reconhecer a humanidade uns nos outros. É esta humanização do “outro” , através da empatia, que permite transformar conflitos em oportunidades de cooperação.
Na Guiné-Bissau, a Fundação Instituto Marquês de Valle Flôr (IMVF) está a implementar o projeto Observatório da Paz – Nô Cudji Paz, que atua no reforço de organizações locais, capacitação de jovens e mulheres e promoção da mediação de conflitos. Este projeto, que conta também com a colaboração da Liga Guineense dos Direitos Humanos e do Timbuktu Institute, demonstra como as fundações podem ser uma plataforma de prevenção da radicalização e de fortalecimento das comunidades.
Estas histórias demonstram que as fundações e redes filantrópicas e movimentos como o Reimagining Peace, possuem a flexibilidade e a coragem de agir onde outros não conseguem. Podem arriscar em iniciativas inovadoras, apoiar vozes marginalizadas e criar pontes entre o local e o global. São estas fundações que mostram que a paz se constrói todos os dias, com paciência, persistência e vontade de mudar narrativas.
Num tempo em que a polarização cresce, a filantropia pode e deve ser uma força de despolarização. Pode combater a desinformação, aproximar quem discorda e criar plataformas de entendimento comuns. Pode ainda usar a tecnologia para mapear vulnerabilidades, promover histórias positivas e fortalecer comunidades.
Como referiu Vesna Agic, “a construção da paz começa com as pessoas”. A filantropia, quando centrada nas pessoas, é uma semente de futuro em tempos de incerteza.
Centro Português de Fundações