A recente ameaça de imposição de tarifas de 200% sobre os vinhos europeus por parte da administração norte-americana, expôs uma vez mais a vulnerabilidade do setor vitivinícola às flutuações políticas e económicas globais. Portugal, cujo segundo maior destino de exportação de vinhos é precisamente os Estados Unidos, não escapou aos efeitos desta ameaça. Ainda que esta medida tenha sido parcialmente revertida, com a aplicação de uma tarifa universal de 10% e a sua suspensão temporária por 90 dias, o impacto foi imediato e muitos importadores acabaram mesmo por suspender encomendas. Hoje, o clima de incerteza permanece.

A atual conjuntura levanta uma questão essencial para o futuro do vinho português: como podemos reforçar a nossa resiliência face a crises externas? Devemos apostar na consolidação da nossa identidade vinícola tradicional ou arriscar novas formas de nos posicionarmos no mercado global? A resposta, acredito, está no equilíbrio.

Portugal é, por excelência, um país de castas únicas. São mais de 250 variedades autóctones identificadas e que conferem aos nossos vinhos uma personalidade e autenticidade difíceis de replicar. Esta diversidade resulta de séculos de adaptação às especificidades dos nossos solos e microclimas, e traduz-se numa oferta enológica que conta uma história diferente em cada garrafa, de norte a sul do país.

Num mercado global onde o consumidor valoriza cada vez mais a origem, a diferenciação e a ligação ao território, as castas autóctones portuguesas são um ativo valioso na internacionalização do nosso vinho. Elas não são apenas um elemento técnico do mesmo são um manifesto cultural, uma expressão da nossa herança que, bem comunicada, pode transformar-se num argumento de exportação imbatível.

No entanto, proteger a tradição não deve significar resistir à mudança. A inovação, seja tecnológica, nos métodos de produção ou na comunicação, é indispensável para valorizar os nossos vinhos. Falamos de práticas de viticultura sustentável que combatem os efeitos das alterações climáticas, de técnicas de vinificação que respeitam a identidade da uva, de modelos logísticos mais eficientes e, sobretudo, de uma nova abordagem à comunicação e ao marketing digital.

O consumidor global está online e quer conhecer as histórias que estão dentro de cada garrafa. Procura a transparência, certificações ambientais, experiências. Cabe-nos a nós, produtores, dar esse salto sem perder o pé na autenticidade.

Por outro lado, o atual contexto com os EUA reforça a urgência de diversificar mercados. A Ásia e a América Latina, em crescimento no consumo de vinhos de qualidade, devem ser encaradas como prioridades estratégicas. Não basta estarmos presentes, é preciso posicionarmo-nos enquanto produtores de excelência e isso faz-se com consistência, identidade e inovação.

O futuro do vinho português não se define por uma escolha entre tradição e inovação, mas pela capacidade de unir essas duas forças em harmonia. Ao honrarmos as nossas castas autóctones e, simultaneamente, adotarmos práticas modernas e sustentáveis, estaremos a construir um modelo de vitivinicultura que respeita o passado, responde ao presente e projeta o futuro.

Num mundo em permanente transformação, onde a única constante é a mudança, o vinho português pode, e deve, ser uma referência de autenticidade, qualidade e adaptação a novas realidades.

Diretor-Geral da Cas’Amaro