Celebrou-se recentemente o Dia da Produção Nacional — uma data que nos convida a valorizar o talento, os recursos e a tecnologia que temos ao nosso dispor, bem como a imaginar um futuro mais ambicioso e autónomo. Pode parecer um contrassenso, numa altura em que os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística revelam que Portugal continua a registar um défice comercial. Em 2024, as importações aumentaram 4,7%, enquanto as exportações recuaram 1,8%. Esta discrepância sublinha a urgência de reequilibrar a balança comercial e de gerar mais valor através da produção local. E nunca este debate foi tão pertinente como agora.
Num contexto global marcado pelo regresso de políticas protecionistas e por incertezas geopolíticas, reforçar a nossa capacidade produtiva deixou de ser apenas uma opção económica para se tornar uma estratégia vital de competitividade e resiliência. Até porque, atualmente, produzir significa muito mais do que gerar riqueza imediata: é gerar valor com consciência ambiental e social, contribuindo para o desenvolvimento de uma economia mais circular e para o estímulo da inovação local. Em áreas como a energia, a agroindústria, a tecnologia ou os têxteis, investir no fabrico nacional é, ou deveria ser, sinónimo de apostar em cadeias de valor mais sustentáveis, na criação de emprego qualificado e no fortalecimento da autonomia estratégica do país.
Na corrida para descarbonizar a economia, esta aposta torna-se ainda mais relevante. Ao investir em energias renováveis — como a solar, a hídrica ou os combustíveis sustentáveis — não estamos apenas a reduzir a dependência de importações com elevada pegada carbónica e a promover a eficiência energética. Estamos, sobretudo, a alinhar a nossa produção com as metas climáticas globais e a garantir uma prosperidade que respeite os limites dos recursos naturais.
Por todo o país, surgem exemplos de como é possível inovar e, ao mesmo tempo, cuidar do futuro. Desde projetos que aplicam princípios circulares, com uma gestão mais eficiente de resíduos, até à investigação e aplicação de processos e materiais de baixo impacte ambiental. Na agricultura, ganham força soluções que incorporam práticas regenerativas, equilibrando produtividade com a preservação dos ecossistemas. E na indústria, a aposta em tecnologias limpas e em combustíveis alternativos aos fósseis permite-nos reduzir significativamente as emissões de carbono, ao mesmo tempo que reforçamos a independência energética do setor. Esta transição é essencial para dar resposta à urgência climática, mas representa também uma oportunidade para impulsionar o desenvolvimento económico de Portugal, através da diferenciação e da inovação.
Ainda assim, há um longo caminho a percorrer. A taxa de circularidade em Portugal é uma das mais baixas da Europa: apenas 2,8% dos materiais são reintroduzidos na cadeia de valor — um valor muito abaixo da média europeia, de 11,8%. O que explica este atraso? São vários os fatores: muitas pequenas e médias empresas enfrentam dificuldades no acesso a financiamento e não dispõem de infraestruturas adequadas para triagem e reciclagem. A par disso, a literacia ambiental entre os consumidores continua limitada e os incentivos públicos ainda são insuficientes para acelerar a adoção de soluções circulares.
Superar estes desafios exige uma abordagem integrada e colaborativa, que combine uma governação eficaz, políticas de incentivo robustas e uma cooperação estreita entre setor público, a academia e as empresas. Só assim poderemos posicionar Portugal como uma referência global em sustentabilidade e, acima de tudo, transformar a inovação nacional numa alavanca de crescimento económico.
Para celebrarmos a produção nacional, é essencial reconhecermos este desafio incontornável: é urgente investir na inovação local, dinamizar a economia circular e consolidar Portugal como um exemplo a seguir. Reconhecer o valor do que produzimos e apostar num futuro mais verde, resiliente e inovador é, talvez, a melhor forma de honrar o nosso legado industrial — e de escrever, com ambição, o próximo capítulo da nossa história económica.
Diretor-geral da Eco-Oil