A Nova Ordem Mundial e a geopolítica são temas que refletem a complexa teia de relações de poder, influência e interesses que moldam o cenário internacional. A expressão "nova ordem mundial" até para os maiores teóricos da conspiração pode dar um filme, mas o que realmente sugere é uma reconfiguração das dinâmicas globais, frequentemente impulsionada por mudanças significativas em políticas, economias e alianças estratégicas entre países.

Quando falamos em “nova ordem mundial”, necessito enaltecer uma das maiores figuras da geopolítica do século XX, Henry Kissinger (1923 – 2023) teve um papel crucial na formação da nova ordem mundial, quando foi Secretário de Estado e Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, durante a administração de Richard Nixon e Gerald Ford – talvez um dos mais brilhantes estrategas da política externa americana do século XX e o impulsionador na década de 70, para a aproximação dos EUA e da China Comunista Maoísta, possibilitando alavancar com esta aproximação o isolamento político da antiga URSS, sem esquecer o seu envolvimento  na guerra do “Yom Kippur”, que teria como fórmula novamente o isolamento politico da URSS (atualmente Rússia).

No contexto contemporâneo do século XXI, a nova ordem mundial é marcada por um multipolarismo crescente, após a Guerra Fria que dividia o mundo entre os blocos liderados pelos Estados Unidos da América e a antiga URSS. O colapso soviético levou a um período de unipolaridade dos EUA. No entanto, nas últimas décadas, o surgimento de potências como a China e a Índia e o ressurgimento da Rússia no panorama internacional têm desafiado a hegemonia americana, criando um ambiente mais fragmentado e competitivo e com focos altamente regionais seja no mundo árabe, africano ou em Taiwan. Neste enquadramento deveríamos questionar, qual o papel do velho continente como força de equilíbrio, seja económica ou militar, neste enredo geoestratégico. E esta, hein?!

A geopolítica contemporânea é, portanto, caracterizada por uma complexidade de interações em que capacidade militar, tecnologia, influência económica, diplomacia e soft power são mecanismos cruciais para o equilíbrio de forças. As disputas territoriais, rivalidades económicas e conflitos ideológicos vão continuar a moldar o cenário global neste próximo século. As questões como mudanças climáticas, terrorismo e pandemias podem até exigir cooperação multilateral, mas os interesses nacionais vão prevalecer, tendo como foco os recursos naturais. Regressando historicamente à aproximação na década de 70 dos EUA e da China, este movimento político possibilitou posteriormente, em 1991, a adesão da China à Organização Mundial do Comércio – e aqui economicamente entramos no início da “nova ordem mundial” e das reformas económicas pós-Mao.

A nível macroeconómico, o PIB dos EUA vs. China, segundo dados do Banco Mundial (2022), evoluiu da seguinte forma em 1970 (US$ 1.07T vs. US$ 92.6B), e em 2022 (US$ 25.44T vs. US$ 17.96T), em 50 anos não só a China mudou drasticamente a sua política económica como em muitas áreas tornou-se líder mundial, e está a modernizar o seu arsenal militar. É necessário enaltecer que diversos estudos apontam que nos próximos 50 anos a China e a Índia ultrapassem os EUA a nível de PIB, mas precisamos ter cuidado nesta métrica, se calcularmos PIB vs. PIB per capita e as condicionantes sociais da Índia/China vs. EUA, a nível social. Mas de um cenário temos a certeza: os EUA a nível militar e financeiro continuam e vão continuar a ser a potencia hegemónica nas próximas décadas.

Não tenho comentado o papel da União Europeia, porque o velho continente dos ideais políticos e sociais, nesta minha leitura, está a atravessar um momento de enorme encruzilhada geopolítica e sem liderança estadista por força de diversas condicionantes. A União Europeia, necessita reinventar-se internamente, com urgência, para manter a coesão e reposicionar-se a nível de política externa (aproximando África da UE), caso queira ter capacidade mobilizadora e de transformação mundial.

Neste enquadramento a velha estratégia de Kissinger “realpolitik”, que prioriza os interesses pragmáticos e a estabilidade sobre ideais ou princípios ideológicos, ou seja é a política externa baseada em cálculos de poder e do interesse nacional, porventura será uma atitude necessária para a UE enquadrar-se neste xadrez geoestratégico contemporâneo, tendo em consideração que o dinamismo e a capacidade militar do Reino Unido já não fazem parte desta equação de enorme complexidade estratégica (infelizmente), pelo menos em seio de UE. Neste mundo altamente globalização e interligado, observamos as movimentações no conflito Israel/Palestiniano e na invasão da Ucrânia, diversos reposicionamentos estratégicos dos blocos económicos/políticos, face à nova reorganização de poder mundial, onde China/Rússia tentam ser o contrapeso dos EUA e os BRICS se alinham em movimentações de menor dependência do dólar, vivemos atualmente num período de “revolução” de alguns países face ao dólar e transações mundiais.

Mas quando falamos de nova ordem mundial, o ano de 2024 é relevante. Celebra-se o 75.º aniversário da NATO, celebração de enorme relevância histórica pelo facto de termos um conflito próximo dos limites territoriais da UE. E neste mesmo ano celebra-se o 75.º aniversário da implementação da R epública Popular da China. Não  se deve comparar uma organização com uma nação, mas o simbolismo temporal de ambos realça o papel na esfera internacional destes atores nas próximas décadas.

Em 2024, a nova ordem mundial está num processo transformativo e veremos onde os interesses de cada bloco e as dinâmicas de poder internacional vão ser cruciais na configuração do poder. Mas o que podemos afirmar e observar é que os EUA continuam sendo a única superpotência militar (mais de 880B US$/2024), sendo o orçamento de defesa de 2.02T US$/2024, segundo o Departamento da Defesa dos EUA, que cobre todas as agências do governo (sendo o maior a nível mundial sem qualquer comparação possível no G20). E continuam a ser a superpotência económica, apesar dos desafios pela ascensão da China. A nível diplomático /militar os EUA estão a fortalecer a sua presença no Indo-Pacífico para contrabalançar a influência chinesa na região.

No reverso da medalha observamos a China numa abordagem expansionista a nível militar no mar do sul, criando áreas de tensão internacional, a fazer um aumento de investimento gigantesco na área da tecnologia e a querer dinamizar a Rota da Seda, querendo com esta iniciativa aumentar o raio de influência nas áreas estratégicas para a China através de investimento em infraestruturas comerciais, promovendo a dependência económica e aumentado o poderio económico entre Europa, África e Ásia, ao mesmo tempo que exerce um estilo de diplomacia assertiva e dura.

A União Europeia, por sua vez, está a reposicionar-se nesta encruzilhada no cenário global, na perspetiva de reduzir a dependência militar dos EUA, na busca incessante de aumentar a autonomia estratégica, desenvolvendo iniciativas de defesa europeia coletivas e aumentando os orçamentos militares e cibernéticos para ataques não convencionais a infraestruturas-chave e incrementando a cooperação entre estados a nível de inteligência dos serviços de informação e segurança integrada. E por último, a nível diplomático, a ampliar e renovar as relações internacionais com países emergentes e aliados, abordando cautelosamente a relação UE-China.

Em suma, a “nova ordem mundial” e o cenário geoestratégico em 2024 caracterizam-se por uma competição crescente entre os EUA e a China, com a União Europeia num caminho mais independente e tentando ser mais assertiva. Mas ainda podemos afirmar que, apesar desta multipolaridade, os EUA continuarão o driver económico, financeiro e militar do mundo nas próximas décadas.

Termino este artigo citando Henry Kissinger, um dos maiores estrategas mundiais : “A América não tem amigos permanentes ou inimigos, apenas interesses.”