As eleições legislativas de 2025 vieram confirmar uma nova era na política portuguesa. A nova composição da Assembleia da República reflete um realinhamento de forças, em que a Aliança Democrática (AD) surge algo reforçada, embora longe de alcançar uma maioria absoluta, o Chega se consolida como um ator político relevante e o Partido Socialista (PS) sofre um recuo profundo, fragilizando-se como alternativa governativa. Resultado? A AD, apesar de ter vencido as eleições, continuará a governar em minoria, o que a obriga a negociações e entendimentos constantes com as restantes forças políticas representadas na Assembleia da República. A boa notícia? No imediato, essa necessidade poderá ser facilitada pela clara debilidade parlamentar e política do PS, que levará tempo a digerir o peso da pesada derrota sofrida nas urnas.

A médio prazo, no entanto, o maior desafio poderá vir de outra frente: o Chega. Este partido, que passou de fenómeno a presença sólida no Parlamento, tem agora não apenas mais deputados, mas também a ambição (legítima) de se afirmar como futura força governante. O seu discurso assenta numa retórica incisiva contra a imigração, a corrupção e o alegado esgotamento dos partidos tradicionais. Num país no qual  o descontentamento social cresce à boleia de dificuldades económicas e perceções de injustiça, estas bandeiras encontram terreno fértil. Ao mesmo tempo, a sua posição enquanto partido de oposição permitir-lhe-á capitalizar os erros e hesitações do governo, apresentando-se firmemente como uma alternativa “fora do sistema”. É, pois, previsível que tente explorar cada falha da AD, o que dificultará a existência de um entendimento à direita. Assim, embora seja expectável que, numa fase inicial, a AD consiga aprovar medidas com apoios cirúrgicos, a previsibilidade e a estabilidade da sua governação poderão rapidamente ser colocadas em causa.

Curiosamente, visto pelas minhas lentes, neste novo ciclo o maior risco não reside no equilíbrio parlamentar instável, mas sobretudo nos desafios que o contexto internacional e económico impõem. O mundo vive tempos de grande incerteza: guerras prolongadas, tensões geopolíticas, cadeias de abastecimento pressionadas e a desaceleração do crescimento global são realidades das quais não nos podemos alhear. De facto, Portugal é um país pequeno e altamente dependente de fatores externos, razão pela qual não está imune a estas dinâmicas. Devemos, pois, estar atentos aos sinais de quebra económica que começam a surgir, os quais voltam a colocar o tema das finanças públicas no centro do debate político.

É importante recordar que as metas orçamentais são para cumprir, com tudo o que isso implica. Em particular, num contexto de menor crescimento económico, as medidas que habitualmente garantem paz social – como aumentos de pensões e salários ou reduções de impostos – ficam comprometidas. Esta realidade torna-se ainda mais evidente perante pressões adicionais sobre a despesa pública, como é o caso da necessidade de reforçar – significativamente – os gastos com a defesa, decorrentes do novo contexto de segurança europeia.

É neste quadro que se exigirá do novo governo uma capacidade de liderança política invulgar. A tentação de uma governação centrada no dia-a-dia, focada em pequenas vitórias táticas, terá de ser superada por uma visão estratégica, reformista e orientada para resultados. Neste contexto, é preciso utilizar bem os recursos financeiros disponíveis – particularmente os provenientes do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e dos fundos comunitários do atual quadro financeiro pois, na verdade, estes são provavelmente os últimos grandes pacotes de apoio de que o país poderá beneficiar nas próximas décadas. Infelizmente, a execução do PRR está claramente atrasada, os fundos parecem continuar a ser subaproveitados algo que, mais uma vez, ameaça comprometer esta oportunidade histórica de transformar a realidade económica do país.

Assim, é nossa obrigação garantir que a execução do dinheiro disponível é uma verdadeira prioridade nacional. No entanto, não se trata de gastar mais: temos de gastar melhor. O país precisa de investimentos estruturantes, que melhorem a produtividade e a competitividade, reforcem a coesão territorial e preparem Portugal para os desafios da transição digital e climática. Educação, saúde, ciência, infraestruturas, justiça, administração pública – todos estes setores exigem reformas, investimento e visão. Tal só será possível com um governo determinado, com uma máquina do Estado eficaz e com consensos políticos alargados.

Portugal encontra-se, pois, diante de uma encruzilhada: pode aproveitar os próximos anos para dar um salto qualitativo no seu desenvolvimento ou perder mais uma década em disputas estéreis. O futuro começa agora – e não há margem para o erro.

NOTA: Este artigo apenas expressa a opinião do seu autor, não representando a posição das entidades com as quais colabora.