Com efeito, a obscuridade e ambivalência dos dispositivos legais que regulamentam a matéria - concretamente os artigos 1095.º a 1097.º do Código Civil, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2019 de 12 de Fevereiro -  é de tal ordem que, deu e continua a dar azo às mais variadas interpretações jurídicas, quer quanto à fixação do prazo de duração inicial do contrato de arrendamento, quer ainda quanto à imperatividade ou não das suas renovações automáticas, bem como do respetivo prazo de renovação…!

Senão vejamos,

A matéria do Arrendamento Urbano conheceu profundas alterações com a Reforma operada pela Lei 12/2019 e Lei n.º 13/2019 de 12 de Fevereiro que entraram em vigor logo no dia seguinte ao da sua publicação. Aqui, interessa-nos particularmente a Lei 13/2019 de 12 de Fevereiro que estabeleceu medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios; a reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger arrendatários em situações de especial fragilidade.

Ora, diz-nos o preceituado no n.º 2 do artigo 1095.º do Código Civil que “o prazo… não pode, contudo, ser inferior a um nem superior a 30 anos, considerando-se automaticamente ampliado ou reduzido aos referidos limites mínimo e máximo quando, respetivamente, fique aquém do primeiro ou ultrapasse o segundo.”. Estipula-se, assim que qualquer contrato de arrendamento celebrado a partir de 13 de Fevereiro de 2019 terá o prazo mínimo de 1 ano - prazo que deve constar de cláusula inserta no contrato – fazendo, assim, cessar a ausência de prazo mínimo, até então vigente.

A questão complica-se, porém, por força do n.º 1 do artigo 1096.º do Código Civil nos termos do qual “Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos, se esta for inferior”. Consagra-se, aqui, uma norma supletiva de renovação automática nos contratos de arrendamento para habitação permanente, isto é: a renovação automática terá sempre lugar, desde que as partes não estipulem em sentido contrário.

No entanto, a falta de rigor legislativo na definição do sentido e alcance da ressalva, contida na primeira parte do referido preceito legal, leva a uns a concluir pela possibilidade de afastamento pelas partes da renovação automática e a outros pela possibilidade de afastamento não só da renovação automática, como também do prazo de renovação de três anos aí previsto! Começam, assim, a surgir as divergências interpretativas…

Por seu turno, diz-nos o n.º 3 do 1097.º do Código Civil, que “A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data”, daqui resultando reforçada a importância do prazo de 3 anos no arrendamento para habitação permanente, havendo quem a ele se refira como que um prazo mínimo “encapotado” para o Senhorio.

Pois bem, naturalmente que o reforço do prazo de 3 anos nos contratos de arrendamento para habitação permanente provém da referida necessidade de assegurar a estabilidade no arrendamento e de combater a especulação imobiliária no respetivo mercado - linhas mestras desta Reforma: É, pois, essa a ratio legis dos fortes limites aí impostos à liberdade contratual na modelação da atual relação locatícia, bem como, aos direitos extintivos da mesma por parte do Senhorio.

Por tudo quanto se expôs, impõe-se concluir que a autonomia privada no âmbito da relação contratual entre Senhorio e Arrendatário encontra-se condicionada não só à exigência de um prazo mínimo de um ano – resultante do artigo 1095º n.º 2 do C.C. que consagra uma norma imperativa que não admite convenção em contrário - mas também quanto à sua renovação pois, ainda que as partes possam convencionar a exclusão da possibilidade de qualquer renovação, só terão liberdade para convencionar prazo de renovação igual ou superior a três anos, impondo o legislador um prazo mínimo, também imperativo, de três anos para cada renovação.

Ou seja, na prática, para que um contrato de arrendamento para habitação permanente celebrado a partir de 13 de Fevereiro de 2019 tenha apenas a duração de 1 ano é imprescindível que as partes estipulem no contrato a sua caducidade no final desse prazo, sob pena de o contrato de arrendamento se renovar automática e sucessivamente por períodos de 3 anos - hipótese em que o Senhorio não se poderá opor à renovação nos primeiros 3 anos de vigência do contrato, com a única exceção de ele ou os seus descendentes em primeiro grau necessitarem da habitação.

Por último, caso as partes não estipulem qualquer prazo para o contrato, o mesmo considera-se celebrado por prazo certo, por um período de 5 anos.

Melhor seria, no entanto, a bem da certeza e segurança jurídicas que as disposições legais aqui citadas fossem devidamente clarificadas, pondo termo à enorme discórdia interpretativa numa matéria de tão relevante interesse social.