É evidente que a inteligência artificial chegou para mudar muitas coisas e que será necessário adaptar-se a essas mudanças, especialmente no âmbito profissional.

Bernard Marr, futurista, consultor e coach de algumas das organizações mais conhecidas do mundo, autor de cerca de vinte livros e colunista da prestigiada revista Forbes, explica num artigo publicado há alguns dias no seu site pessoal que Aneesh Raman, Chief Economic Opportunity Officer do LinkedIn, prevê que 70% das competências exigidas num posto de trabalho médio em 2030 serão diferentes das atuais, representando um ponto de inflexão para o mercado de trabalho.

Este número implica que praticamente todas as pessoas acabarão por trabalhar em postos onde realizarão tarefas de novo tipo, mesmo que o nome do cargo não mude.

Até agora, a avaliação do candidato para o cargo na empresa tem-se baseado em aspetos como a universidade de origem, a rede de contactos ou as referências do último empregador, indicadores que, na opinião de Raman, pouco revelam a verdadeira capacidade do candidato para enfrentar tarefas específicas.

A introdução da inteligência artificial nos postos de trabalho obriga a decompor cada cargo em atividades e a comparar essas atividades com competências específicas verificáveis. Quando os algoritmos automatizam ou transformam tarefas, o método tradicional de trabalho (e, com ele, o de seleção de candidatos) não é capaz de cumprir o seu objetivo, uma vez que visa um nível superior e não competências concretas.

Da ruptura à reinvenção do mercado de trabalho

A mudança que começaremos a viver em breve, segundo Raman, articula-se em quatro fases claramente diferenciadas: em primeiro lugar, surge a disrupção inicial, visível na adoção massiva de ferramentas de IA generativa. Em seguida, vem a transformação das tarefas, origem dos referidos 70% de variação de competências. Em terceiro lugar, surgem funções que hoje não existem — há apenas 25 anos, ninguém contratava cientistas de dados ou responsáveis por redes sociais. Por fim, consolida-se a economia da inovação, um estágio em que a criatividade humana se torna a principal fonte de valor.

Seguindo o discurso de Raman, surge neste cenário o paradigma da especialização impossível: as empresas procuram gestores capazes de orquestrar a estratégia global de IA e, ao mesmo tempo, dominar os meandros dos modelos de aprendizagem automática. Na prática, tendem a escolher entre dois perfis incompletos: por um lado, o especialista técnico que perde de vista a aplicação comercial e, por outro, o gestor experiente que não distingue entre promessa e realidade tecnológica. Ambas as opções resultam em projetos caros e desconectados das necessidades da empresa e do mercado.

Quando a gestão tecnológica recai sobre especialistas académicos, a organização corre o risco de transformar as suas iniciativas em exercícios puramente investigativos. O efeito espelho ocorre quando se coloca à frente um gestor sem bagagem técnica: a dependência de fornecedores externos e o escasso critério para filtrar ofertas conduzem a implementações falhadas. O resultado é um «paradoxo do especialista», que expõe as limitações de uma abordagem excessivamente personalista e sublinha a urgência de equipas multidisciplinares.

Perante esta tensão, surge um método prático para o profissional em atividade: classificar as doze tarefas principais do seu cargo em três blocos. O primeiro reúne as tarefas suscetíveis de automatização total ou parcial — como a redação de rascunhos ou a síntese de notas. O segundo é composto por atividades que serão executadas de forma colaborativa com IA, o que exige literacia em ferramentas como copilotos ou chatbots generativos. O terceiro agrupa as ações eminentemente humanas, aquelas que definem a contribuição diferenciada.

Competências humanas para a economia da inovação

A análise de Raman alerta que aqueles que dependem excessivamente do primeiro bloco deverão requalificar-se rapidamente. Paralelamente, a procura por habilidades tradicionalmente rotuladas como «blandas» cresce a um ritmo sustentado. Entre elas destacam-se a curiosidade, a compaixão, a criatividade, a coragem e a comunicação, cinco capacidades que os sistemas atuais só conseguem imitar, não desenvolver. De facto, nos indicadores do LinkedIn, já superam em importância a própria literacia em IA.

Estas aptidões têm uma característica comum: o seu caráter duradouro face à obsolescência acelerada do conhecimento técnico.

A remuneração económica pelo trabalho passará a ser baseada em competências e será impulsionada o surgimento de perfis híbridos que combinam aquisição, desenvolvimento e gestão de competências em equipas orientadas para projetos. Casos como o da IBM, que delega tarefas rotineiras a um assistente de IA e vincula a remuneração à formação contínua, ilustram este movimento que já está em curso.