
O mais recente relatório de ameaças digitais da ESET lança luz sobre um fenómeno inquietante, mas cada vez mais previsível: os trojans, ou cavalos de Troia, continuam a liderar as estatísticas de deteção de malware em Portugal — tal como no resto do mundo. No primeiro semestre de 2025, sete das ameaças mais comuns em solo nacional são trojans, desenhados para ludibriar utilizadores, infiltrar sistemas e abrir portas discretas a ações maliciosas de maior escala.
O HTML/Phishing.Agent lidera a tabela em Portugal e globalmente. Trata-se de ficheiros HTML aparentemente inócuos, distribuídos por email, mas desenhados com mestria para enganar o utilizador e levar à instalação de malware — ou pior, à entrega inconsciente de credenciais e dados sensíveis. Mais do que uma ameaça técnica, este é um ataque à confiança e ao discernimento dos utilizadores.
Logo a seguir, surge o DOC/Fraud, documentos Microsoft Word recheados de conteúdo fraudulento, usados como cavalo de Troia para campanhas de phishing mais sofisticadas. Em terceiro lugar, um nome relativamente recente: HTML/FakeCaptcha, que utiliza interfaces falsas de CAPTCHA para enganar o utilizador a executar código malicioso — uma evolução preocupante das técnicas de engenharia social.
O padrão é claro e perigoso: estas ameaças não dependem de falhas técnicas nos sistemas. Dependem, sobretudo, da falibilidade humana. São golpes digitais cuidadosamente encenados, jogando com a urgência, o medo, a distração e a rotina dos utilizadores.
O elo mais fraco continua a ser o humano
A engenharia social está a refinar-se e a adaptar-se com uma velocidade que desafia os tradicionais mecanismos de defesa empresarial. Os atacantes sabem onde está a vulnerabilidade real: na caixa de entrada do email e no clique distraído.
“Divulgar estes dados específicos de Portugal permite às empresas e aos consumidores compreenderem que estas ameaças não são abstratas nem distantes”, afirma Ricardo Neves, Marketing Manager da ESET Portugal. O alerta é claro: isto está a acontecer aqui, agora, e com impacto direto no tecido empresarial português — especialmente nas PME, onde a maturidade em cibersegurança continua abaixo do necessário.
Sugestões práticas para quem lidera na tecnologia e segurança
A análise do relatório da ESET deixa evidente que a resposta não pode ser apenas técnica. Exige visão estratégica, cultura organizacional e planeamento contínuo. Eis algumas recomendações para líderes de TI, CIOs e CISOs:
- Refrescar as políticas de cibersegurança com base em ameaças locais
As deteções em Portugal não diferem radicalmente do cenário global, mas a ordem e intensidade com que surgem são indicativos úteis. As políticas devem refletir essa realidade específica, não apenas seguir modelos genéricos. - Formação contínua, realista e segmentada para os colaboradores
Os utilizadores não são especialistas. Devem ser treinados com simulações práticas, alertas contextuais e feedback constante. Um colaborador treinado é, hoje, uma das melhores firewalls da organização. - Rever a higiene digital das infraestruturas
A presença do Win/Exploit.CVE-2017-11882 — uma falha de 2017 — na lista dos mais detetados mostra que a negligência na atualização de software continua a ser uma porta aberta aos atacantes. A automação de atualizações críticas e o controlo de versões obsoletas devem ser prioridades absolutas. - Adotar soluções de proteção com inteligência local
Ter uma ferramenta de segurança que compreenda os padrões de ataque específicos ao mercado português pode fazer a diferença entre uma deteção atempada e uma violação grave. As soluções devem ser globais, mas contextualmente informadas. - Reforçar o controlo de anexos e scripts em emails e websites
Com ameaças como o JS/Agent e o PDF/Phishing.Agent a explorarem canais triviais, é essencial implementar políticas de zero trust em anexo e execução de scripts — especialmente em terminais com acesso a dados sensíveis.
Portugal não é exceção — mas pode ser exemplo
A presença contínua destes trojans no ciberespaço português não deve ser vista como inevitável. Pelo contrário: é uma oportunidade para testar a maturidade do nosso ecossistema tecnológico. As empresas portuguesas que enfrentam diariamente o desafio da transformação digital devem ver a cibersegurança não como custo, mas como pilar estratégico.
A digitalização só será sustentável se for segura. E essa segurança começa na perceção clara de que, por detrás de cada email aparentemente legítimo, pode esconder-se um adversário silencioso — com intenções muito claras.