
Foram já sete as alterações feitas à Constituição da República desde a sua aprovação, em 1976. A atual composição parlamentar permite uma 8ª revisão, como já foi proposto pelos maiores quatro partidos do sistema político – PSD, Chega, PS e IL – e parece mesmo que uma revisão vai ser inevitável. Em causa pode estar o direito à segurança no trabalho – incluindo nas obras e em fábricas.
Saiba o que aconteceu na última revisão constitucional.
Tanto em Governos socialistas ou sociais-democratas, quando se defenderam alterações à Constituição, os discursos dos líderes partidários do PS e do PSD convergem em dois eixos: o da liberalização da economia, com o objetivo de abrir as portas de Portugal aos mercados externos e ao espaço Schengen; o da transformação do Estado e descentralização de competências, para facilitar a aplicação automática das decisões do Parlamento Europeu e da União Europeia em Portugal, sobrepondo-se a lei europeia ao poder nacional e regional.
Na alteração constitucional de 2005, a última aprovada no parlamento, pretendia-se “um aprofundamento da União Europeia” que se efetivou, por exemplo, em alterações ao código do trabalho, tornando-o mais próximo dos piores exemplos europeus, facilitando os despedimentos e colocando limitações à contratação coletiva. Estas alterações foram sempre justificadas com o alegado excesso de “carga ideológica” na Constituição.
Um cenário de convergência à direita sem solução de Governo à vista
Chega, Aliança Democrática e Iniciativa Liberal fazem agora uma maioria de direita no parlamento. Esta maioria tem como pontos de convergência dois assuntos fundamentais que podem significar alterações profundas no futuro do país.
Por um lado, convergem numa visão mais fundamentalista do liberalismo económico, que recuperaram dos programas eleitorais do ex-primeiro-ministro Passos Coelho, não sendo possível encontrar diferenças significativas ou motivos de discórdia entre a AD, Chega e IL no que diz respeito à economia e às finanças do país. Por outro lado, as três forças políticas concordam que é tempo de convergir na redação e aprovação de uma revisão constitucional, tendo como pano de fundo o atual momento de instabilidade governativa.
Esta aprovação, que também deverá contar com a participação dos socialistas, pretende novamente mexer com as leis que regulam o trabalho em Portugal e limitar a liberdade de associação e de expressão, tal como já foi admitido por Jorge Pires, dirigente da Iniciativa Liberal, que pretende retirar o direito à segurança no trabalho – incluindo em obras e nas fábricas – da atual Constituição da República, o que preocupa os trabalhadores portugueses.
Entre as diferentes propostas destes partidos, fala-se também em alterações como a redução do número de deputados na Assembleia da República, as penas de prisão perpétua e a legalização do lobbying, inicialmente através do reforço das competências do Conselho Económico Social (CES) onde estão as associações empresariais e representantes do Governo, órgão que até agora era consultivo, mas a que o PSD pretende dar mais força no processo de decisões, colocando assim a legislação à mercê desses interesses.
Todos diferentes, todos iguais: um resumo dos jogos de poder entre PSD, Chega e PS para ajustar posições políticas numa eventual solução governativa.
Apesar de muitos partidos à direita já terem apresentado, até num passado mais recente, os seus programas com propostas para a revisão constitucional, tendo sido a Iniciativa Liberal a primeira a abordar o assunto. Contudo, foi André Ventura (CH) que avançou com o primeiro passo para as negociações, enviando uma carta a Luís Montenegro (AD) e a Rui Rocha (IL) com as propostas do Chega para essa revisão.
Estes partidos mantêm que vão avançar com programas próprios e que não lhes interessa negociá-los antes e em conjunto, como foi dito por Rui Rocha, que defendeu que esta é uma discussão para ser tida no parlamento.
Da parte dos sociais-democratas, pouco ou nada se diz sobre a revisão constitucional, com alguns dirigentes falando apenas na abertura do PSD para negociar com todos os partidos políticos, certamente aguardando um entendimento com o PS ou com o Chega, ou até, num cenário ideal para Luís Montenegro, continuar a governar como até agora, conseguindo acordos pontuais com os dois maiores partidos da oposição.
Para o Chega, não lhes interesando neste momento fazer parte diretamente de um Governo, a tática tem sido pressionar Luís Montenegro a constituir uma solução governativa que tenha como base um acordo entre a Iniciativa Liberal, a Aliança Democrática e o Chega, para que os Orçamentos de Estado sejam aprovados através de uma maioria parlamentar de direita, replicando assim uma solução idêntica à da “Geringonça”.