Um homem, de 56 anos, acusado de ter matado a companheira, de 43 anos, induzindo-a a beber ácido sulfúrico misturado com vinho branco, foi hoje condenado, no Tribunal de Aveiro, a 19 anos e nove meses de prisão.

Durante a leitura do acórdão, a juíza presidente disse que o tribunal de júri deu como provada “a essencialidade dos factos constantes da acusação”, concluindo que o arguido “agiu de forma deliberada no sentido de atentar contra a vida da sua companheira e assim conseguiu”.

A magistrada realçou o modo de execução do crime, adiantando que, de todos os meios insidiosos possíveis, o usado foi “particularmente pérfido e traiçoeiro”, e referiu que a motivação para agir foram sobretudo “questões essencialmente patrimoniais”, o que é demonstrativo de uma atuação egoísta e de desprezo pela vida humana.

O tribunal de júri, composto por três juízes profissionais e por quatro jurados, deu como provado que o arguido fez uma mistura de vinho com ácido das baterias, que contem ácido sulfúrico, e colocou-a no frigorífico para a vítima beber, tendo logo em seguida dispensado os funcionários.

Segundo a juíza, o tribunal chegou a esta conclusão com base em provas indiretas conjugadas entre si. “O tribunal entendeu que tem prova, ainda que indireta, mas suficientemente segura e lógica, para demonstrar que o senhor fez aquela mistura e a colocou posteriormente no frigorífico”, disse.

Neste ponto, a magistrada explicou que foram consideradas relevantes as declarações de um funcionário que viu o arguido junto ao armário, onde estava guardava o ácido, e que referiu que este surgiu depois com uma garrafa de vinho na mão, tendo referido: “Quando ela beber isto até estala”.

A juíza referiu ainda que a relação entre o arguido e a vítima era pautada por conflitos permanente e palavras muito duras trocadas entre ambos, afastando a versão do arguido de que tinha uma relação magnífica com a vítima, que era apenas ensombrada por um problema de álcool.

“Não foi isso que ficou aqui patente todas as testemunhas disseram o contrário. Esta relação estava muito longe de ser magnífica. Era uma relação profundamente disfuncional em que o senhor assumia uma posição de controlo e controlava, usando a seu favor, uma dependência que é uma doença”, disse.

A magistrada disse ainda que o tribunal não teve em conta a versão apresentada pelo arguido de que a morte da companheira teria sido um suicídio, adiantando não haver evidências dessa circunstância.

O arguido negou também a existência de um conflito com a vítima, relativamente à instalação de uma nova sociedade, mas a juíza assinalou que isso foi contrariado por todas as testemunhas que foram ouvidas, incluindo os seus funcionários.

O arguido foi, assim, condenado a 19 anos e nove meses de prisão, por um crime de homicídio na sua forma qualificada, por ter atentado contra a vida da sua companheira e por ter usado um meio particularmente insidioso, tendo sido absolvido de um crime de omissão de auxílio.

Além da pena de prisão, o arguido, que se encontra em prisão domiciliária, foi condenando a pagar uma indemnização de 190 mil euros a distribuir pelos três filhos da vítima.

Durante o julgamento, o arguido negou a acusação, alegando que a mulher lhe confessou que “tinha bebido água das baterias a chorar” e referiu que tentou transportá-la para o Hospital mas esta acabou por perder os sentidos e ligou ao Instituto Nacional de Emergência Médica a pedir uma ambulância.

O arguido disse ainda que a mulher tinha problemas de consumo excessivo de álcool, negando a existência de violência doméstica. “Ela chamou várias vezes a GNR, mas era por causa do vinho. Ela ficava descontrolada e não sabia o que fazia”, afirmou.

Segundo a acusação do Ministério Público (MP), os factos ocorreram a 27 de maio de 2022, na residência onde o casal vivia, em Águeda, após uma discussão relacionada com a mudança da sede da empresa para um imóvel que a ofendida tinha herdado, o que não era do seu agrado.

A acusação o arguido referia que o arguido pegou em ácido sulfúrico que tinha adquirido para “reanimar” baterias dos camiões e despejou uma parte numa garrafa que já se encontrava aberta e com algum vinho branco já consumido, colocando depois a garrafa no frigorífico.

Ao final da tarde, a mulher dirigiu-se ao frigorífico e ingeriu o líquido que se encontrava no interior da garrafa, o que lhe provocou graves queimaduras na língua, faringe, esófago, traqueia, diafragma estômago e intestinos.

Quando regressou a casa, o arguido encontrou a mulher “mal disposta” e a vomitar sangue, mas só ao fim de cerca de três horas é que decidiu chamar o 112. A mulher foi transportada para o Hospital de Águeda onde acabou por morrer.

LUSA