
"A prisão já demonstrou que sozinha é ineficaz para debelar o crime organizado enquanto este permanecer com as vantagens ganhas, é preciso privar o crime organizado dos recursos económicos que acumula com a prática de atividades ilícitas e que usa para o seu próprio fortalecimentos. Usa os recursos acumulados para reinvestir no crime, perpetrando e perpetuando as suas ações ilícitas", disse o juiz desembargador do Tribunal de Recurso de Maputo, Luís Mabote.
O responsável falava hoje, em Maputo, em representação do presidente do Tribunal Supremo, durante a abertura do seminário internacional sobre recuperação de ativos e justa compensação das vítimas, organizado pelo Centro de Integridade Pública, organização não-governamental, tendo defendido compensações às vítimas do crime organizado.
"Tão importante quanto a recuperação de ativos, é a compensação das vítimas do crime. Uma justiça focada apenas na punição no agente do crime sem prestar a atenção devida aos efeitos e ao ressarcimento do sofrimento causado à vítima é uma justiça incompleta. É preciso mudar de paradigma, é preciso começarmos a promover princípios da justiça restaurativa", disse o juiz.
Luís Mabote defendeu que já não basta a aplicação da pena de prisão perante a prática de crimes organizados, defendendo serem necessárias outras sanções para desencorajar os infratores que usam os recursos para novos recrutamentos para o crime que corrompe e fragiliza as instituições do Estado.
"Sem esse compromisso coletivo, até aos melhores sistemas legais e as mais completas redes institucionais permanecerão ineficazes. Esta tarefa é de todos nós e a sociedade civil tem um papel decisivo nesta luta. Cabe à sociedade civil exigir transparência, informar o público e promover uma cultura de integridade", disse juiz desembargador do Tribunal de Recurso de Maputo.
No mesmo evento, o Ministério Público moçambicano adiantou que os ativos recuperados em face de atos criminais, além de compensar as vítimas, poderão ser aplicados em projetos de desenvolvimento do país.
"A procuradoria-geral da república reconhece que, mais do que sancionar os infratores, é necessário a remoção da esfera do infrator e todo o benefício gerado pela prática do crime, colocando o agente do crime na situação em que estaria se o crime não tivesse sido acontecido", disse Naftal Zucula, da Procuradoria-Geral da República de Moçambique (PGR).
Em 29 de abril, a Lusa noticiou que o Gabinete Central de Recuperação de Ativos em Moçambique apreendeu bens orçados em cerca de 4,4 mil milhões de meticais (61 milhões de euros) em 2024, contra 1,3 mil milhões (17 milhões de euros) no ano anterior.
Dos dados revelados naquela data pelo procurador-geral de Moçambique, Américo Letela, indicam que do total de bens apreendidos 34 são imóveis, avaliados em pouco mais de 4,2 mil milhões de meticais (quase 60 milhões de euros) e 183 são veículos, avaliados em pouco mais de 134 milhões de meticais (quase 2 milhões de euros).
"Ressaltamos a necessidade de aprovação de uma lei de confisco civil, como meio adicional de combate à criminalidade organizada e transnacional, retirando dos criminosos os proventos da sua atividade ilícita", pediu Américo Letela, que apresentava o relatório anual de atividades da instituição.
Em junho de 2024, o Ministério Público indicava que, só nos últimos 10 anos, Moçambique tinha recuperado quase três mil milhões de meticais (43 milhões de euros) em 11 mil processos de combate à corrupção, financiamento ao terrorismo e branqueamento de capitais.
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