O Sporting chega ao dérbi dos dérbis em condições de sagrar-se campeão na Luz e leva a vantagem de poder jogar para dois resultados (por discutível que seja a ideia de isto constituir uma vantagem — quem não se lembra do Sporting de Peseiro em 2005, no mesmo palco, ou do Benfica de Jesus em 2013, no Dragão?).

Conseguiu este estatuto, porém, por uma unha negra, já na compensação, depois de ter estado a perder muito tempo e por força de uma crença fortíssima. Uma crença que resulta do empenho dos jogadores, mas que o público devolve como um boomerang para dentro do relvado.

Aos 83 minutos Maxi acordou Alvalade, ao empatar o jogo no primeiro remate enquadrado dos leões à baliza gilista; já no período de compensação, Eduardo Quaresma levou à erupção total do vulcão e ao delírio de mais de 44 mil espectadores. Foi um caminho bem sofrido e muito pouco bem jogado. Justo? Claro que sim: o jogo teve quase sempre o mesmo sentido. Mas perante a eficácia defensiva do Gil, é natural que César Peixoto e os seus homens levem para o Minho alguma compreensível frustração. Um ponto, pelo menos um, estava quase na mão...

Os leões entraram autoritários, e outra coisa não seria de esperar. Mas volume de ataque nem sempre rima com qualidade, muito menos eficácia, e a verdade é que desde cedo que percebeu que a linha ofensiva não estava inspirada na procura das melhores soluções. Um toque artístico quando se exigia algo mais objetivo, precipitações no passe ou no remate quando o lance aconselhava maior retenção ou, aí sim, a invenção de um passe de mágica.

O Gil Vicente compactou-se maioritariamente no último terço, o que se tornava natural perante o maior pendor ofensivo leonino, mas esteve muito longe de estacionar autocarros em frente à área. Teve, isso sim, na sua linha mais recuada autênticos panzers, nomeadamente os dois centrais, que viveram com a preocupação constante de não deixar Gyokeres receber e virar-se para as suas arrancadas. Quer Marvin quer Buatu conseguiram quase sempre anular o sueco com ele ainda de costas para a baliza, obrigando-o ao passe ou mesmo à perda de bola. Da única vez, na primeira, parte, em que Gyokeres se virou naquele jeito habitual, Buatu ganhou a frente e anulou o perigo.

Já se disse que o Gil não estacionou autocarros. E além dos panzers tem dois ou três carros de corrida perfeitamente capazes de levar a bola para a frente. Perante o adiantamento leonino, foi o lateral esquerdo, Mutombo, quem encontrou espaço para entrar na área do Sporting e sofrer um penálti (bem) descortinado pelo VAR. Era apenas a segunda incursão minhota até perto de Rui Silva, mas teve, aos 27 minutos, um efeito pesado em Alvalade.

O público desconfiou ligeiramente da equipa até ao intervalo e durante quase toda a segunda parte, porque os sinais vindos de dentro do campo eram os mesmos: más decisões na hora do último passe e as sucessivas tentativas de jogar por dentro (que se compreendem pela ausência de cabeceadores que possam fazer render um bom jogo exterior) a esbarrarem sempre na excelente exibição da defesa do Gil Vicente.

Não poderá nunca o Sporting, já se referiu, queixar-se de falta de solidariedade das bancadas, mesmo perante o desespero de verem os minutos passarem e as soluções escassearem. Quando uma tentativa de remate frustrada ressaltou para Maxi e ele encheu o pé para o empate, os decibéis subiram muito. A equipa sentiu e correu ainda mais em busca da vitória. E sabe-se que uma equipa crente (e forte, claro) pode fazer qualquer coisa até ao apito final. O público protestou (e bem) pelo facto de o tempo de compensação ser apenas de 5 minutos, mas como Eduardo Quaresma marcou aos 90+3 já só se pedia o fim da partida e... o Sporting campeão.