Em plena época alta nos Açores, e em particular na ilha de São Miguel, o turismo volta a ocupar o centro das atenções. Talvez por ser verão, talvez pela escassez de outros temas cativantes nesta silly season, ou talvez porque, de facto, o turismo se tornou demasiado visível para ser ignorado.
Nas ruas, ouvem-se queixas sobre os carros das rent-a-car que congestionam o trânsito, sobre turistas que cometem infrações por desconhecimento ou desatenção, sobre miradouros e trilhos sobrelotados, ou sobre restaurantes onde já não se consegue mesa sem uma reserva e onde os preços parecem pensados para carteiras de outras latitudes. Nos jornais e na RTP Açores, discute-se se uma economia pode — ou deve — depender de um único setor de atividade.
Entretanto, em qualquer um destes fóruns, alguém traz para cima da mesa as estatísticas do turismo na Região, onde é evidente o crescente e tão relevante contributo para a geração de riqueza regional, na criação de emprego e na projeção internacional dos Açores, e quase que parece que o tema fica fechado. E nem chega a ser defendido que, idealmente, nenhuma economia saudável deve assentar num só pilar. Mas a questão que se impõe é: o que fazer? Condicionar o crescimento do turismo ou fomentar outros setores? E quais? A agricultura? A indústria transformadora? A economia do mar? E este debate, sobre o projeto de desenvolvimento estratégico dos Açores, que urge, acaba também por nem chegar a ter lugar.
O turismo, com todos os seus desafios, é, de forma incontornável, um setor que gera emprego, atrai investimento e tem capacidade — e necessidade — de integrar mão-de-obra vinda de fora. Tem sido, quase em exclusivo, a nossa arma para evitar que o encolhimento demográfico em todas as ilhas não seja ainda maior. É um motor económico que, bem gerido, pode, e deve, ser sustentável, inclusivo e regenerador. Mas para isso, precisa, tanto de planos estratégicos, quanto precisa de reconhecimento social.
Em tempos, afirmei que o turismo só é bom para os Açores quando for bom para os açorianos. Uma afirmação que continua a ter eco nestes dias. No entanto, hoje, acrescento: tem de ser bom para os açorianos — e os açorianos têm de o reconhecer como tal. E esse reconhecimento não se impõe por decreto. Constrói-se com diálogo, com escuta ativa, com políticas públicas que envolvam as comunidades e com práticas empresariais que respeitem o território e as pessoas que nele vivem, valorizando-o e valorizando-as.
Enquanto persistir a perceção de que o turismo é mais prejudicial do que benéfico, mesmo que os dados digam o contrário, teremos um problema de fundo. Um problema de narrativa, de participação e de pertença. E esse problema só se resolve com uma discussão abrangente, aberta e honesta entre todos os que fazem parte desta terra — residentes, empresários, decisores e visitantes.
O turismo nos Açores não pode ser apenas uma atividade económica. Tem de ser uma expressão da nossa identidade, da nossa hospitalidade, da nossa forma de estar no mundo. E isso implica cuidar do que somos, tanto quanto promovemos o que temos.