Prejuízos da Santa Casa nas mãos do Tribunal de Contas

Com "dúvidas " sobre a reavaliação dos imóveis da SCML, que ditaram perdas 58 milhões, a ex-vice-provedora remeteu a informação ao Tribunal de Contas. Decisão poderá obrigar a rever contas.

A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) levou a cabo uma reavaliação dos imóveis que a obrigou a corrigir as contas, empurrando a instituição para prejuízos em 2021 e 2022. A ex-vice-provedora, Ana Vitória Azevedo, questionou o método usado e pediu uma avaliação do Tribunal de Contas que poderá obrigar a novo ajuste. Em declarações ao ECO, Ana Vitória Azevedo defende que “teria sido prudente” esperar pela decisão da entidade liderada por José Tavares.

Os revisores oficiais de contas “deitaram por terra as avaliações feitas por avaliadores independentes” e certificados pela CMVM, que vinha a ser feita desde 2014 e que, “de forma completamente administrativa e oficiosa”, foram deitadas “abaixo”, afirmou Ana Vitória Azevedo, que se demitiu no final de março, ainda antes da exoneração decidida pelo Governo, por divergências com a restante mesa da SCML.

As novas avaliações foram realizadas por revisores oficiais de contas, seguindo um método diferente, um exercício que “resultou numa subavaliação do património” da Santa Casa, apontou.

A antiga vice-provedora reitera, deste modo, as críticas que fez durante a audição desta quarta-feira, no Parlamento, na sequência de um requerimento da Iniciativa Liberal. “Nem tenho palavras para explicar a leviandade e os erros técnicos cometidos por estes auditores”, disse aos deputados, elencando que havia até “pareceres dos avaliadores” a dizerem que era “um erro crasso”.

Em declarações ao ECO, Ana Vitória Azevedo explica que estes revisores de contas foram contratados “logo em maio ou junho de 2023” pelo pelouro financeiro da Santa Casa, na sequência da tomada de posse da nova provedora, Ana Jorge, e dos pedidos feitos pela anterior ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, nomeadamente sobre a revisão das contas de 2021 e 2022. “Eu senti que as coisas não estavam a ser feitas da maneira correta”, diz.

Perante as “dúvidas de interpretação” entre os avaliadores e revisores oficiais de contas, Ana Vitória Azevedo garante que expôs a situação à provedora Ana Jorge e submeteu “toda a documentação, todos os concursos, todas as avaliações desde 2014” à entidade liderada por José Tavares e pediu “ao Tribunal de Contas para esclarecer quem é que estava certo”, conta a vice-provedora, ao ECO. “A mesa da Santa Casa não esperou por essa pronúncia e pôs na rua os relatórios com essa avaliação”, lamenta.

Em causa estão divergências sobre a valorização contabilística dos imóveis, com impacto nas contas da Santa Casa. As novas avaliações, que levaram a correções nas contas de 2021 e 2022, foram realizadas “no pressuposto de que os respetivos contratos de arrendamento seriam denunciados, sendo de imediato efetuadas obras de beneficiação, seguidas da negociação de novas rendas a valores de mercado“, segundo consta nos novos relatórios publicados.

Ora, “a adoção deste critério” conduziu a que as demonstrações financeiras anteriormente apresentadas “tivessem evidenciado expectativas de rentabilidade não consentâneas com a realidade da SCML e, sobretudo, com a sua efetiva capacidade de geração de valor económico e de tesouraria“, lê-se.

A revisão originou uma redução “significativa” de 57,9 milhões de euros no valor dos imóveis arrendados, dos quais 13,4 milhões de euros em 2022 e 44,5 milhões de euros em 2021 (4,4 milhões desse ano e 40,1 de anos anteriores).

Acho que teria sido prudente, em vez de fazer um alarme dizendo que houve uma sobrevalorização do património, e tendo em conta que havia esta divergência interpretativa, esperar para verificar qual era a interpretação correta.

Ana Vitória Azevedo

Ex-vice-provedora da Santa Casa

De acordo com o novo relatório, feito na sequência da auditoria pedida pelo anterior Executivo, o resultado líquido positivo de 10,9 milhões de euros da Santa Casa passou para um prejuízo de 12,4 milhões, enquanto os resultados de 2021 sofreram um ajustamento de 20,1 milhões para 39,8 milhões de prejuízos,

Caso o Tribunal de Contas venha a considerar que o anterior método de avaliação estava correto e não o usado pelos auditores, as contas poderão ter de ser novamente corrigidas. No limite, poderiam ser revertidas as perdas estimadas de 57,9 milhões em 2021 e 2022. A confirmar-se, os resultados líquidos da Santa Casa passariam a ser positivos.

Em declarações ao ECO, a ex-vice-provedora adianta que não concordou com a reavaliação dos imóveis, tendo, inclusive deixado isso expresso numa declaração de voto, aquando da aprovação da revisão de contas. “Está escrito“, atira, considerando que seria “de bom senso” esperar pelo parecer do TdC antes de fazer a revisão.

“Acho que teria sido prudente, em vez de fazer um alarme dizendo que houve uma sobrevalorização do património, e tendo em conta que havia esta divergência interpretativa, esperar para verificar qual era a interpretação correta”, remata, referindo que a atual administração poderá ter pintado um “quadro ainda pior” das contas da Santa Casa “do que aquele que eventualmente existirá”. “Foram uma sucessão de decisões com as quais eu não me revi e foi por isso que me demiti”, conclui.

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