• Entrevista por:
  • Teresa Cotrim

Tim Vieira: “Falar de amor em negócios parece uma coisa lamechas mas é uma vantagem competitiva”

Tim Vieira ficou conhecido no Shark Tank como o tubarão que mais dinheiro investiu em startups. Cerca de um milhão de euros. Diz que fica "sempre de pé atrás quando alguém diz que nunca falhou".

Amar, perdoar, humanizar. Estes três verbos definem a forma de Tim Vieira atuar no mundo dos negócios. Uma espécie de mantras que o guiam no caminho do sucesso.

Cá dentro é estrangeiro, lá fora é português. Ficou conhecido no Shark Tank como o tubarão que mais dinheiro investiu em startups. Cerca de um milhão de euros. Mas confessa que fora do programa ainda colocou mais dois milhões. Muitos dos negócios falharam. Mas os que sobreviveram valeram mesmo a pena. Ao todo já deve ter investido em mais de 40 empresas.

É otimista por natureza, característica moldada pela cultura africana e um sonhador. Sabe que se fosse mais focado ganharia mais dinheiro mas não seria tão feliz. É assim Tim Vieira, CEO da Bravegeneration.

Na 2.ª edição do European Innovation Academy (EIA), promovida em Portugal pelo Banco Santander e pela Câmara de Cascais, onde cerca de 500 jovens universitários, entre os quais 120 portugueses, têm apenas três semanas para criar uma ideia de negócio e apresentar um projeto viável aos investidores — Tim Vieira deixou a plateia de coração nas mãos. Neste encontro dedicado à inovação e à inteligência artificial, o empresário deixou como TPC aos futuros empreendedores apenas três exercícios: “Amem, perdoem e sejam mais humanos. Se o fizerem, terão sucesso e serão mais felizes.”

É conhecido como um serial entrepreneur mas brinca, dizendo: “Se calhar também sou um serial failure.” Qual a taxa de sucesso das empresas em que já investiu?

Entre 10% e 20%. Mas as que resultam valem mesmo a pena. Se não tivesse feito 40 negócios para ter oito bons, se calhar não teria quase nada. Também sei que se fosse um empreendedor mais focado, faria mais dinheiro. Mas era menos feliz. Sou um sonhador. Gosto de pessoas, de as ajudar e de acreditar. O meu papel nas empresas sempre foi os relacionamentos. Abrir portas.

Viveu muitos anos na África do Sul, Nelson Mandela, antigo presidente desse país é uma inspiração. Afirma que este lhe deu duas lições de vida: amar e perdoar. Aplica-as nos negócios?

Sempre. Essas duas palavras são fundamentais para o sucesso de um empreendedor. O amor não é uma fraqueza. O amor é uma força. Se não colocarmos amor nas decisões que tomamos, vão correr mal. Falar de amor em negócios parece uma coisa lamechas mas é uma vantagem competitiva. Com amor temos melhores equipas, pessoas mais motivadas e decidimos melhor. Vejo muito isso nas mulheres. Tomam mais decisões por amor. Não o fazem por um retorno a curto prazo. Com esta postura parece que as suas opções dão mais certo no futuro. Os homens deviam aprender esta lição.

Sempre acreditou no amor ou foi a idade que lhe abriu o coração?

Não, desde jovem que penso assim. Tenho pautado a minha vida empresarial com esta premissa. Hoje, dou esta dica aos jovens empreendedores. Afinal, a minha vantagem não foi ser um bom marketeer, um excelente financeiro ou um software developer. O meu maior trunfo foi sempre o meu lado humano. Sempre estive com as pessoas. Quando estamos desse lado começamos a perceber quais são as nossas vantagens.

A lição do perdão… Perdoa facilmente?

Sim, perdoo. É claro que magoa ser atraiçoado. Seja por um sócio, um cliente ou um fornecedor mas há que continuar em frente. Esquecer. Até porque nunca fiz um negócio a pensar que correria mal. O normal é ser um win-win. Mas a vida é o que é. Quando não dá certo, perdoamos, senão não andamos para a frente. No limite, até se pode voltar a fazer negócio com essa pessoa, quem sabe!

Já lhe aconteceu? Voltar a fazer negócio com quem o traiu?

Claro que sim, várias vezes.

Teve um discurso disruptivo no evento da European Innovation Academy, dizendo aos cerca de 400 jovens que ouviam a sua apresentação que os robôs não lhes vão tirar o emprego.

Os jovens têm talento. São criativos, pelo que terão espaço para trabalhar. Há muito receio da mão-de-obra relacionada com o preço mas na realidade nada há a temer. Quem deveria ter medo são os chineses. Esses é que são os nossos robôs; já levaram muitas das nossas indústrias para a China. Os estudantes com a formação que recebem têm de pensar maior do que isso. Têm de ser o motor criativo e gerar novas oportunidades que resolvam problemas. De fazer o mundo melhor. A partir daí originar novos empregos.

O grande trunfo dos jovens é a sua humanidade. Um robô nunca conseguirá ser criativo.

Cem por cento de acordo. As pessoas que ficarem mais humanas serão as que terão mais oportunidades. Vão gerir equipas e fazer networking. Essa será a sua vantagem competitiva. E não digo isto por ser uma coisa fixe mas sim porque o vejo como uma vantagem. Fazer um negócio será sempre com pessoas. Não estou a ver alguém a fechar uma parceria olhando olhos nos olhos de um robô. Os portugueses nesse campo estão à frente. Somos um povo autêntico, criativo – temos a palavra desenrasca (sorrisos) e somos adaptáveis, ou seja trabalhamos com qualquer cultura. Seremos competitivos.

Fico sempre de pé atrás quando alguém diz que nunca falhou.

Aconselha os jovens a ganharem experiência rapidamente.

Tem de ser. Têm de testar o que resulta e o que não resulta. Têm de ensaiar montar uma equipa. Fico sempre de pé atrás quando alguém diz que nunca falhou.

Porquê?

Porque tentou pouco. Provavelmente falhará no negócio onde poderei colocar dinheiro (risos).

Na sua opinião as startup são o futuro?

Sem dúvida, 40% das empresas estão a mudar. Muitas das grandes companhias estão estagnadas. As startup podem ser uma lufada de ar fresco. Até nesse sentido há oportunidades. Isto porque nem sempre é preciso criar uma empresa. Pode ser-se empreendedor num negócio já montado. Os skills destes jovens podem ser muito importantes para algumas das grandes empresas.

Não acredita no business plan para projetar um negócio mas incentiva os jovens a fazerem um business plan pessoal, ou seja, uma espécie de mapa empresarial de si próprios.

Já analisei muitos business plan que parecem perfeitos. Está tudo certinho para dar certo mas depois, devido às pessoas, dão errado. Ficam seis meses na empresa, depois começam a dizer que aquele não é o caminho que desejam seguir, ou não têm os valores, nem a ética, nem as crenças para que a empresa realmente tenha sucesso. Tudo cai. Antes de pensar nesse business plan, que na maioria das vezes é uma grande mentira — projetar um negócio a seis meses, é quase uma farsa. O mundo está sempre a mudar, quanto mais a cinco anos — é mais honesto pensar num plano para o seu futuro. O que é estático são as pessoas. Quais os seus valores, as suas ambições. Se o fizer, até terá mais oportunidades de investimento em si próprio e na empresa. No fim, até poderá vir a ser mais feliz.

Antes de ir ter com um investidor, o empreendedor deve escrever num papel em branco: quem sou, o que quero fazer, onde quero ir e como gostaria de lá chegar? Um exercício filosófico.

Sim. A experiência mostra-me que isso só acontece perto dos 40 anos. Que as pessoas só têm essa consciência depois de terem atravessado metade da sua vida. Deparar-se nessa fase de que afinal, o que é importante já não é a carreira, ou o dinheiro… Pode ser um pouco tarde. Se fizer este exercício aos 20 anos e souber de antemão o que quer para o seu futuro, então viverá a vida com esse princípio, atraindo mais cedo para junto de si quem o ajude a crescer. Acredito mesmo que temos de saber o que queremos fazer da vida. Até para sermos felizes. Se formos felizes, os negócios correm melhor.

É feliz?

Sim, sou muito feliz. É fácil ser feliz se pensarmos que ninguém nos deve nada. Se fizermos por nós e tivermos o que merecemos, então, assim é fácil ser feliz.

Em quantos negócios já investiu?

Talvez uns 40. Ou mais. A verdade é que é sempre igual. No final, são sempre as pessoas. Se são lutadores conseguem virar o jogo. É isto que me dá a coragem de continuar sempre a investir. De encontrar as boas pessoas. De saber que há sempre mais lá fora prontas a surpreender-nos.

Sempre as pessoas. Quando avalia uma ideia de negócio esse é o asset mais importante?

A equipa é o mais importante. Se é sólida e se tiver talento, a probabilidade de ter sucesso aumenta. Mas é tudo uma probabilidade. Nada é garantido. Quando começamos a fazer o take off e a equipa está focada, existe pouco ego entre eles e querem mesmo ter sucesso, então até podem ter o produto errado que o negócio pode vencer, uma vez que podem adaptar o produto.

Qual foi o seu primeiro negócio? Foi alugar cassetes de vídeo VHS e Beta. Comprava cópias e colocava-as nas lojas de portugueses.

Qual foi o seu primeiro negócio?

Foi alugar cassetes de vídeo VHS e Beta. Comprava cópias e colocava-as nas lojas de portugueses. Eles alugavam-nas e fazíamos revenue share. Não tinha rendas, não tinha quase custos. Depois, comecei também a vender CD. Foi aí que percebi que o negócio acontece através das pessoas que conhecemos. Das portas que se abrem.

Quanto é que ganhou?

Não sei exatamente quanto ganhei mas com esse dinheiro comprei o meu primeiro carro. Três meses antes de fazer 16 anos, tive um acidente. Às cinco da manhã, espatifei o automóvel. O meu pai, destroçado, disse-me: “O carro era teu, o que é que eu vou fazer?” Aprendi uma grande lição. Este acidente mudou a minha perspetiva de vida.

Nessa idade já tinha a paixão dos carros?

O meu pai passou-me essa paixão. Hoje até tenho a Tim Garage onde guardo os meus carros e os meus jogos de quando era criança. É importante termos estes espaços na nossa vida. Os meus filhos adoram ir para lá brincar comigo e ainda lhes consigo ganhar em alguns jogos. Ainda sou champion. Fico todo contente. É importante manter vivo o espírito de criança.

Fala muito no seu pai.

É o meu melhor amigo. Este mês fomos com os meus dois filhos à Rússia. Três gerações top. Vimos Portugal a jogar. Foi muito bom.

Depois das cassetes é que entrou no mundo da cerveja artesanal?

Sim, começou por ser artesanal mas depressa deixou de o ser. Apaixonei-me por este negócio. Fazer cerveja num mercado onde só havia um concorrente — o que levou também o consumidor a ter um carinho especial pela nossa marca, depois como estava em África do Sul havia sanções. Estávamos no tempo do Apartheid, foi uma experiência espetacular. Lembro-me que ia todos os dias ao ginásio, que era mesmo ao lado do escritório, para tomar banho. Dizia olá aos funcionários e aos clientes, mas não fazia desporto. Tomava banho e voltava ao trabalho. Vivia no escritório (risos).

O que aconteceu a essa empresa? Vendeu-a?

Não. A maior cervejaria de África do Sul quis comprá-la. Tentei não a vender e, no final, tive de a fechar. Fiquei no zero. Depois, essa cervejaria abriu-me portas em Angola.

Sentiu que fracassou?

Não, pelo contrário. Foi um dos meus maiores sucessos porque me fez pensar de uma forma diferente. Matou-me o ego. Pensava que conseguia ganhar todas as batalhas. Ali estava a prova que nem sempre é assim. Há batalhas que não precisamos de ganhar.

Foi essa experiência que lhe ensinou que falhar num negócio não é o fim do mundo?

Foi. Se experimentámos tudo e aprendemos muito, ficamos com isso no currículo. Nessa altura, percebi que falhar um negócio não é o fim do mundo. Nesse dia, estava a ver o canal da CNN e vi os conflitos em Sarajevo, na Bósnia, então pensei: Não tens problema nenhum. Só perdeste uma empresa. Estás no lado dos sortudos. Aliás, muitos de nós estamos nesse lado. Se viajarmos pelo mundo perceberemos isso muito facilmente. Nessa altura, recebi muita ajuda. Lá está, o networking, as pessoas. Sempre as pessoas!

Continuou a querer ser um empreendedor?

Isso nunca mudou. Depois fui para Angola. Queria um mercado onde pudesse trabalhar, Angola estava a crescer e foi aí que criei a Special Edition Holding, que acabou por se transformar numa das empresas mais relevantes no setor dos Media, onde detém algumas das principais agências de publicidade, eventos, ativações de marca e planeamento de meios (TBWA/Angola, Original Brands, Multileme, Onmedia). E tudo isto aconteceu porque criei uma equipa top.

E, curiosamente cá dentro não sou português mas lá fora, sou o português. Então é difícil.

Enveredou por um setor de risco?

Todos são setores de risco. Se estiver num setor onde não existe risco, então está no setor errado. Ou então vai acontecer algum problema. Isso não existe.

Quanto empregados tem?

Temos 400. Muitos dos quais já estão comigo há mais de 10 anos. Tenho muito orgulho.

Mas agora aparece como CEO da Bravegeneration (Europa), é uma capital de risco?

Não, não é uma capital de risco. O grupo investe em várias áreas, como agricultura (framboesas e mirtilos), imobiliário e software. Tenho um projeto turístico na Ericeira e no Alqueva. Apoiamos os empreendedores e os negócios em que acreditamos.

Os fundos da empresa, são próprios?

Sim, são fundos próprios. Sou eu mais três sócios.

Funcionam como uma espécie de Business Angels?

Os Business Angels às vezes investem e esquecem. No nosso caso, investimos mas estamos presentes. Somos quem põe o dinheiro mas também trabalhamos. Somos um working business angel.

Como concilia a sua vida profissional tão preenchida com a vida familiar? Disse que gosta de viajar com a família.

Sim, ainda agora fizemos cerca de 3.000 km de Vespa. Foi o máximo. Estamos a preparar uma viagem grande, aliás muito grande. Já fizemos uma de seis meses em que até levei um professor para que os meus filhos não perdessem as aulas (risos).

Casou com 25 anos…

Sim. A minha mulher é espetacular. É uma das grandes responsáveis pelo meu sucesso. Continuamos juntos e temos três filhos.

Algum dos seus filhos tem o seu dom para os negócios?

Tenho dois rapazes e uma menina. O mais velho deve vir a ser músico. Tem uma capacidade incrível para fazer amigos. É muito criativo. O do meio pode ser alguém que fique a tratar dos nossos negócios. Se ele quiser, como é uma pessoa focada, será muito melhor do que eu. Quanto à minha filha não tenho a mais pequena ideia. Se vier a casar só posso desejar boa sorte ao marido (risos).

Os seus genes têm uma mistura de Portugal, Angola, África do Sul…O seu coração é de que país?

O meu coração é mesmo grande (risos). Cabe lá Portugal, África do Sul, Angola e Moçambique. Escolher um seria como estar a selecionar um filho preferido. Ou o dedo de que mais gosto. São todos diferentes. Preciso deles todos.

O que lhe deu cada um destes países?

Angola deu-me oportunidades. Foi também lá que constituí família e criei laços de amizade muito fortes. África do Sul moldou-me. Fez-me ser quem eu sou, ensinou-me a ser otimista. Acreditar que existe sempre uma solução. Portugal, é um país que eu amo muito porque sempre cresci a ser um bocadinho português. E, curiosamente cá dentro não sou português mas lá fora, sou o português. Então é difícil. Acredito muito no futuro de Portugal.

O que deseja para o futuro?

Gosto de fazer projetos que sejam interessantes. Gosto de passar tempo com a minha família, de viajar com eles mas não posso dizer que tenho planos. Se o resto da minha vida for igual ao que vivi até agora, estou bem.

  • Teresa Cotrim

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