Os perigos online têm vindo a crescer, com ameaças mais complexas mas sobretudo massificadas, que exploram as vulnerabilidade técnicas mas também da componente social dos utilizadores, que são enganados para clicar em links através dos quais cedem dados os instalam software malicioso nos computadores, tablets e smartphones. A formação para a cibersegurança é essencial, e a consciência dos riscos que existem, sobretudo entre as populações mais vulneráveis e por isso o Centro Nacional de Cibersegurança, e o Centro Internet Segura, lançam hoje a campanha “O que a Internet diz de si” em parceria com a Ordem dos Psicólogos.

Recorrendo a ditados populares como "Passwords fortes e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém" ou "na Internet todos os utilizadores são pardos", e com as caras conhecidas de Júlio Isidro e Júlia Pinheiro, a campanha foi pensada para os mais velhos, um grupo etário que está a entrar progressivamente no mundo digital e que pode estar mais exposto, como assumiu Isabel Baptista, coordenadora do Departamento de desenvolvimento e Inovação do CNCS.

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A Ordem dos Psicólogos ajudou a definir as mensagens da campanha e é um dos parceiros, com a Câmara de Cascais, e Francisco Miranda Rodrigues, Bastonário da Ordem dos Psicólogos, explica ao SAPO TEK que o desafio da cibersegurança é multifacetado, e que é um desafio societal que está ligado ao trabalho pela paz que a Ordem promove. “Trabalhamos nas ciências comportamentais e processos mentais, e no reconhecimento da centralidade do comportamento humano que é um fator crítico em tudo”, justifica.

O facto das ferramentas digitais serem hoje essenciais na integração, crucial para uma sociedade mais inclusiva, é destacado por Francisco Miranda Rodrigues, que defende que é preciso promover o acesso justo a estas ferramentas, mas com literacia e conhecimento que permita uma navegação em segurança. “Este é um desafio, o da inclusão e combate às desigualdades”.

A Ordem dos Psicólogos tem trabalhado para trazer o conhecimento científico das ciências comportamentais para as áreas dos desafios societais e a cibersegurança é um dos que a organização está a trabalhar para maios visibilidade pública.

“Queremos tornar mais evidente para todos os envolvidos, o CNCS, a sociedade, decisores políticos e responsáveis de instituições, que não basta a tecnologia para nos proteger. A tecnologia também está presente no risco”, explica, lembrando que não basta ter informação disponível porque é preciso perceber o que as pessoas fazem com a informação e o conhecimento que adquirem, a perceção que ganham face ao risco, que atitude têm e como se protegem, e aqui há vários modelos de mudança comportamental que podem ser aplicados.

Nesta área, a preocupação está na rapidez com que a tecnologia evolui, a complexidade crescente o domínio diferenciado que existe.

“A esmagadora maioria das pessoas não tem capacidade para perceber os riscos, tem menos informação, menos conhecimento e reflexão e isso materializa-se na diferença sobre a perceção dos riscos que correm na utilização das ferramentas digitais […] interferem nos comportamentos”, sublinha Francisco Miranda Rodrigues.

Mais conhecimento para reduzir o risco

Muitas vezes, a falta de perceção faz com que a utilização das ferramentas seja atrapalhada, confusa, sobretudo face a mensagens de email que são enganadoras, e os utilizadores acabam por tomar comportamento de risco por não refletirem, porque não têm conhecimento e informação das ameaças.

“Temos de construir muito [conhecimento e perceção de risco], e não é um trabalho fácil, para ajudar a que haja menos diferença entre os utilizadores e reduzir o risco”, defende o Bastonário da Ordem dos Psicólogos. Há ainda o reconhecimento de que este é um problema geracional, porque os mais idosos não tiveram um trabalho tão permanente com a tecnologia e por isso têm menos experiência, menos conhecimento e uma perceção de risco que não é adequada.

“Muitas vezes as pessoas desvalorizam os riscos, acham que a tecnologia as protege e têm um enviesamento de otimismo em relação às consequências negativas”, alerta, reforçando a ideia de que “fazem um cálculo que não é realista, com um otimismo sobre a facilidade de resolver os problemas que depois não são nada fáceis de solucionar”, explica, defendendo que “A prevenção é essencial”.

A forma como os utilizadores têm crenças de externalidade e do controle que têm sobre os seus atos, e das consequências é também apontada. “São muitas vezes crenças irracionais, que não fazem a ligação direta dos riscos e isso altera os seus comportamentos”, reconhece Francisco Miranda Rodrigues.

Mas será que o esforço de inclusão que está a ser feito é demasiado rápido? O bastonário da Ordem dos Psicólogos discorda. “A questão não está no esforço ser demasiado rápido, mas no equilíbrio entre as dimensões desse esforço”, defende. “Entusiasmamo-nos quando falamos de tecnologia e esquecemo-nos que associada à utilização do equipamento tecnológico há todo um contexto que não passam pelas competências técnicas e têm a ver com competências comportamentais”, avisa. Nesta área tem de haver equilíbrio, entre os desafios da digitalização e o desenvolvimento das competências facilitadoras, as soft skills, que permitem uma melhor utilização das competências técnicas, ou hard.

Para Francisco Miranda Rodrigues o esforço de inclusão tem de continuar a ser feito, a par da literacia digital, e de forma rápida. “Temos de conseguir chegar a mais gente”, alerta, lembrando que esta campanha é uma boa forma de garantir maior sensibilização, mas que tem de ser combinada com estratégias para chegar a esta população, com ações de maior capilaridade e com organizações que estão no terreno para uma formação em cascata.

“Da nossa parte, estamos muito empenhados em que Portugal possa, de forma mais transversal, não só na tecnologia mas também nas políticas públicas, integrar mais o conhecimento científico sobre o comportamento humano”, justifica, adiantando que os benefícios são grandes e que podem ser mais explorados com políticas mais efetivas que tragam melhores resultados com menos custos.