Há pedidos que é impossível rejeitar. Não se trata de uma daquelas solicitações de criança, meros caprichos de quem ainda não teve tempo para conhecer o mundo e por isso quer tudo o que de novo vê nele. Aquilo que Tim Wellens estava prestes a alcançar era o zénite de uma carreira, um feito que o respeito que todos devemos à consciência merecia que fosse tentado.

Nem sempre é visto com bons olhos que uma equipa que tenha um ciclista vestido de amarelo desperdice recursos na fuga. Contrariando quem pensa de forma unidimensional, a UAE não cortou as asas a Tim Wellens que perfeito uso fez delas. “O Tadej não gosta que ninguém esteja na fuga, gosta de ter todos com ele”, disse o belga de 34 anos numa entrevista à Sporza, onde também confessou estar na “melhor forma da vida”. A UAE deu liberdade ao experiente ciclista e este completou a trilogia, fazendo um check em vitórias de etapas nas três grandes voltas (duas no Giro, duas na Vuelta e, agora, uma no Tour).

De falta de elegância não podem ser acusados os candidatos a ganhar a Volta a França. Tadej Pogačar caiu na etapa 11 e os rivais não aproveitaram o momento para se porem a andar. O mesmo fez a UAE nesta corrida. Do carro da equipa do esloveno pediu-se que o ritmo fosse reduzido no momento em que Jonas Vingegaard e Florian Lipowitz se envolveram num acidente. Os dois membros do pódio da classificação geral conseguiram voltar ao pelotão. Um gesto admirável de quem não quer que a camisola amarela se decida como um jogo de sorte e azar jogado no casino. O dinamarquês da Visma ainda viria a ter que lidar com um problema mecânico que o fez descair no grupo principal para trocar de velocípede.

Há corridas assim, em que além das oscilações de relevo é preciso lidar com as minas de caos que parecem surgir a cada metro. Entre Muret e Carcassonne, o caminho era pouco duro para se fazerem diferenças nos lugares mais altos da geral. No entanto, aos fugitivos era capaz de os pôr a pensar num dia feliz.

O grupo de dissidentes reuniu tanta gente que parecia ter sido anunciado que na compra de uma rifa saía sempre prémio. Porém, lá no fundo, todos sabiam que apenas um ia prevalecer. Várias tentativas foram feitas para esmigalhar o bloco de mais de três dezenas de indivíduos.

Michael Storer e Quinn Simmons tiveram um papel fundamental nesse aspeto que, azar o deles, foi aproveitado por quem não colaborou assim tanto. O norte-americano da Lidl-Trek ia apelando a uma sincronização que só ele considerava possível.

Tim Wellens, por exemplo, tinha outros planos. Chegado ao final do desafio maior da jornada, uma subida de segunda categoria, isolou-se vestido de bandeira da Bélgica, traje que para ser usado significa ter que superar Remco Evenepoel nos campeonatos nacionais. Ou seja, usar três riscas, uma vermelha, a outra preta e, por fim, a amarela, símbolo de uma das mais relevantes nações do ciclismo, é reflete uma boa época.

Nos restantes 43 quilómetros, estendeu a passadeira a si mesmo até à vitória. Este foi o solo mais longo da carreira, sendo que o anterior (41,8) foi registado há menos de um mês precisamente nos campeonatos belgas. Eis um corredor introspetivo que ficou durante 1’28’’ à espera de Campenaerts.