"Aos órgãos da administração da justiça exigimos integridade no vosso trabalho para que este não seja mais um assassinato sem esclarecimento, engrossando a lista dos filhos nobres desta nação que morreram pelo seu país, sem que, até hoje, alguém tenha sido responsabilizado", declara um comunicado conjunto do Centro de Integridade Pública, Instituto de Estudos Sociais e Económicos, Mulher e Lei na África Austral e Observatório do Meio Rural.

Gilles Cistac, segundo as quatro organizações, "integra uma longa lista de filhos nobres deste país que foram assassinados porque comprometidos com o bem do seu país", assegurando que não vão desistir até que "os assassinos de Samora Machel, Carlos Cardoso, António Siba-Siba Macuácua, Dinis Silica, Gilles Cistac sejam encontrados e punidos".

"O assassinato do professor Gilles Cistac enquadra-se na velha estratégia de assassinar um para silenciar muitos. Não deixaremos que isso aconteça. A força de uma nação não se para com a cobardia das armas", afirma o comunicado.

As organizações recordam os ensinamentos do catedrático sobre o Estado de Direito em Moçambique e "o mais importante é de que as palavras, quando proferidas por homens livres e de pensamento racional, libertam", contra "aqueles que encontraram na cobardia das armas a força para silenciar o professor Gilles Cistac e, assim, ameaçar a todos os moçambicanos livres".

"Como cidadãos deste país que, organizados, trabalham pela defesa e promoção dos direitos humanos, queremos emitir a nossa mensagem de condenação e afirmação do nosso desprezo a este ato bárbaro, encomendado e praticado por homens sem honra nem escrúpulos, cobardes e sem coragem de enfrentar a sabedoria e a nobreza de homens livres", afirmam ainda as quatro organizações da sociedade civil.

O constitucionalista moçambicano de origem francesa Gilles Cistac foi assassinado a tiro na terça-feira de manhã por desconhecidos, à saída de um café no centro de Maputo.

Cistac foi transportado ainda com vida para o Hospital Central de Maputo, onde acabou por morrer cerca das 13:00 locais (11:00 em Lisboa).

A polícia disse na terça-feira que segue a pista de quatro suspeitos, três negros e um branco, e que foi este último quem abriu fogo contra Cistac.

Gilles Cistac era um dos principais especialistas em assuntos constitucionais de Moçambique e, em várias ocasiões, manifestou opiniões jurídicas contrárias aos interesses do Governo e da Frelimo.

Em entrevistas recentes, Cistac considerou que não há impedimentos jurídicos à pretensão da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana, principal partido da oposição) de criar regiões autónomas no país, contrariando declarações opostas de quadros da Frelimo.

Na semana passada, o académico anunciou que ia processar um homem que, através da rede social Facebook e com o pseudónimo Calado Kalashnikov, acusou Cistac de ser um espião francês que obteve a nacionalidade moçambicana de forma fraudulenta.

O Governo moçambicano considerou o atentado "um ato macabro" e espera que os autores sejam "exemplarmente punidos", enquanto o líder da Renamo disse que o académico foi vítima de "radicais da Frelimo" e o MDM (Movimento Democrático de Moçambique, terceira maior força política do país) declarou que se tratou de um assassínio por encomenda.

A Frelimo reagiu na quarta-feira negando envolvimento no crime e considerando que as "acusações gravíssimas" de que foi alvo são "manobras dilatórias" para prejudicar a governação e dividir o país.

HB // APN

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