Discursando na Cidade da Praia na abertura de um atelier de reflexão sobre a educação bilingue em Cabo Verde, José Maria Neves sublinhou que isso só é possível com afetividade e com crianças mais soltas e mais motivadas.

"O momento de entrada de uma criança numa sala de aula pela primeira vez tem sido de choque, de criação de obstáculos. Porque a criança que aprende em casa a falar uma língua (crioulo), é obrigada, ao entrar numa sala de aula, a confrontar-se abruptamente com outra língua que não aprendeu em casa (português)", exemplificou.

"É importante que reflitamos sobre esta questão e aceleremos a introdução da língua cabo-verdiana no processo de ensino e aprendizagem", continuou Neves, incentivando também ao ensino do "bom português" no ensino básico, uma vez que o bilinguismo servirá de base para o multilinguismo nas outras fases do ensino.

José Maria Neves destacou ainda a experiência do Luxemburgo, um país mais pequeno do que Cabo Verde, mas que, além do luxemburguês, fala e aprende inglês, francês e alemão.

"É isso que temos de fazer em Cabo Verde, a partir da língua que falamos em casa", apelou Neves, num discurso que alternou entre o crioulo e o português, referindo que não é preciso revisão constitucional, mas sim trabalho para a língua materna crescer, desenvolver e se afirmar.

Sobre a questão das variantes que se registam em cada uma das nove ilhas habitadas, José Maria Neves disse que isso não é um problema, mas sim uma riqueza que dá força e une os cabo-verdianos, entendendo que cada um deve ensinar de acordo com a variante que é competente.

Recordando a sua intervenção em 2011 na Assembleia Geral das Nações Unidas, feita em crioulo, o primeiro-ministro espera que o debate sobre o ensino da língua materna cabo-verdiana seja levado a outros espaços e fóruns nacionais e internacionais.

O crioulo é a língua que os cabo-verdianos falam no dia-a-dia, estando em curso um processo para a sua oficialização, mas a sua introdução nos currículos escolares só aconteceu no ano letivo de 2013/2014 em duas escolas-piloto na ilha de Santiago, mas o objetivo é alargar a mais escolas do arquipélago.

"Estamos a trabalhar turmas experimentais. As experiências fazem-se para consolidar a ciência e para obter instrumentos capazes de permitir a generalização do ensino bilingue nas nossas escolas", completou a ministra da Educação e Desporto, Fernanda Marques.

O atelier para reflexão do ensino bilingue tem a duração de dois dias e realiza-se no âmbito do Dia Internacional da Língua Materna, que acontece sábado, e das comemorações dos 40 anos da independência de Cabo Verde, que acontecem a 5 de julho deste ano.

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